30 de junho de 2006

Olhares de fora…

Nos últimos dias, em dois locais da blogosfera que visito diariamente [aqui e aqui], revisitei o trabalho de Hargreaves. Motivado pela escrita assertiva do autor e pelo desencanto que se reflecte na escrita desta amiga, destaco um excerto retirado do “Ensino na Sociedade do Conhecimento” que configura um cenário político e social que nos é familiar e onde é possível vislumbrar as mesmas tentativas de reforma.

[…]
Confrontados com a exigência de resultados melhores nas escolas públicas e também com a indisponibilidade dos eleitores para pagarem por elas impostos mais elevados, e, ainda, face à realidade do subfinanciamento e da baixa capacidade dos sistemas urbanos que, muitas vezes, têm dependido de professores pouco qualificados e mal pagos, alguns altos responsáveis tomaram medidas drásticas. Uma das mais importantes foi a estandardização dos testes e dos textos. Desde finais dos anos 80, os curricula prescritos centralmente, com metas de desempenho detalhadas e com prazos-limite curtos para a sua concretização, com avaliações associadas a essas metas e com uma prestação de contas que tem sérias consequências, definiram, em todo o Mundo, urna "nova
ortodoxia" da reforma educativa - oferecendo soluções estandardizadas e a baixo custo a um eleitorado ávido de prestação de contas.

Mais recentemente, as práticas estandardizadas também focalizaram um número limitado de prioridades de ensino e de aprendizagem, estreitamente definidas, como a literacia ou a matemática. Exige-se aos professores que atinjam estes objectivos prioritários através de formatos prescritos com grande pormenor, cuidadosamente redigidos e calendarizados com muita precisão. Realiza-se, então, uma formação intensiva de um grande número de docentes nestas estratégias de ensino “cientificamente comprovadas", com o envolvimento simultâneo dos responsáveis pela direcção das escolas. Existem estudos credíveis que afirmam que estas estratégias podem conduzir a ganhos muito significativos no sucesso dos alunos, bem como à diminuição das diferenças entre o sucesso daqueles que são oriundos das famílias ricas e o das famílias pobres. Não obstante, é questionável que os ganhos obtidos ou a forma rápida de os obter justifiquem os custos acarretam a longo prazo. As fortes estratégias de intervenção, caracterizadas pela prescrição dos programas, pela formação intensiva e pelo acompanhamento subsequente, podem produzir melhoramentos mais acelerados nas escolas mais pobres e com menor potencial e nas suas comunidades, mas também podem reforçar culturas de dependência entre os professores que, quais cantores de karaoke, só aprendem a seguir as indicações prescritas. Em vez de atacarem as causas económicas do reduzido investimento e da baixa capacidade nas comunidades pobres, estas medidas correm o risco de, ao fazê-lo, se debruçarem, sobretudo, sobre os seus efeitos e de se concentrarem na reciclagem dessas culturas mais fracas e altamente dependentes, no seio do corpo docente.

Os apelos à diminuição das diferenças do sucesso entre os alunos não questionam, normalmente, os tipos de sucesso que estão em causa.
Existem cada vez mais provas de que as diferenças de desempenho escolar (definido com base em competências relativamente simples) entre os alunos mais novos podem ser diminuídas, a curto prazo, com mais trabalho e mais prática. No entanto, isto já não acontece num tipo de sucesso mais complexo que possa ser sustentado a longo prazo – aquele que é exigido pela sociedade do conhecimento. Tem sido muito mais fácil aumentar o sucesso básico nos domínios da Literacia e da Matemática, através de uma intervenção baseada na gestão minuciosa dos primeiros anos de escolaridade, do que elevar esses níveis no ensino secundário: Os reformadores ainda não foram capazes de fazer o que é necessário para desenvolver as formas avançadas de aprendizagem que consubstanciam o sucesso nestes níveis mais avançados.

Na sua conversão tardia ao poder e à necessidade da reforma educativa em larga escala, alguns dos teóricos da mudança que no passado pensavam que "não se pod[ia] decretar aquilo que [era] importante para uma prática eficaz", parecem acreditar no oposto hoje. Contudo, o que esses autores parecem ter demonstrado, realmente, é que se pode decretar o que é menos importante - que se pode fazer com que os docentes imitam os seus formadores, ou que consigam pôr em acção desempenhos predeterminados pelo currículo karaoke (desempenhos esses que podem desaparecer logo que cesse também a pressão a curto prazo e que a focalização incida sobre outros domínios), mas que não se pode obrigá-los a promover um ensino e uma aprendizagem aprofundados e complexos, concebidos para servirem, a longo prazo, a sociedade do conhecimento.
[pp. 112-114]

[o negrito é meu]

28 de junho de 2006

Como? Importa-se de repetir?

Tutela vai acreditar entidades para avaliar manuais escolares.
[…] Em declarações à agência Lusa, Jorge Pedreira explicou que «a ideia é que as entidades entreguem candidaturas para terem uma acreditação do Ministério que lhes permita avaliar os manuais, recebendo contrapartidas financeiras», cujo montante não está ainda calculado.
Com entidades acreditadas, a tutela já não terá de nomear comissões de peritos para procederem à certificação prévia dos livros, como prevê o novo regime jurídico dos manuais que será votado esta semana no Parlamento.
Para poderem receber uma acreditação, as entidades terão de cumprir vários requisitos, nomeadamente terem especialistas que possam avaliar o rigor científico, mas também professores dos anos de escolaridade a que se refere o manual que possam certificar a sua qualidade pedagógica. […]

O novo regime jurídico dos manuais, aprovado em Abril em Conselho de Ministros, deverá ser votado favoravelmente na quinta-feira, para começar a ser aplicado no ano lectivo 2007/2008.

Será que o artigo 111º "caiu" antes de ser negociado?

Artigo 111º
Acumulações
1 – O exercício de funções docentes em estabelecimentos de educação ou de ensino públicos é feito em regime de exclusividade.
2 – O regime de exclusividade implica a renúncia ao exercício de quaisquer outras actividades ou funções de natureza profissional, públicas ou privadas, remuneradas ou não, salvo nos casos previstos nos números seguintes.
3 – É permitida a acumulação do exercício de funções docentes em estabelecimentos de educação ou de ensino públicos com:
a) Actividades de carácter ocasional que possam ser consideradas como complemento da actividade docente;
b) O exercício de funções docentes em outros estabelecimentos de educação ou de ensino.
[o negrito é meu]

Adenda: O Titanic, no Público [via Nocturno com gatos].

A caixa negra...

As escolas, ao contrário do que sucede com uma grande parte das instituições que prestam serviço público, não permitem à grande maioria dos cidadãos compreender as dificuldades e propor soluções para os seus problemas. Não são as visitas fugazes dos [poucos] encarregados de educação que se deslocam à escola para tomar conhecimento do percurso escolar dos seus educandos, nem as visitas ainda mais esporádicas dos inspectores [que se dedicam a observar resmas e mais resmas de documentos, mais ou menos folclóricos, que nem de perto nem de longe traduzem a qualidade das práticas educativas] permitem aferir a qualidade dos serviços que aí se prestam. As representações da escola de quem não a vive quotidianamente derivam das opiniões de terceiros: dos alunos, professores e auxiliares da acção educativa [classe profissional em vias de extinção devido ao alargamento do conteúdo funcional do professor], e das memórias que ainda resistem ao tempo dos bancos de escola.

A abertura da escola à comunidade foi uma metáfora criada com o intuito de enfeitar discursos oficiais mas que nunca passou disso mesmo, isto é, sempre foi um simples roteiro de intenções.
A ideia da escola a tempo inteiro mantendo os pais afastados o tempo todo e a ideia peregrina de procurar desresponsabilizar os encarregados de educação pelo acompanhamento dos trabalhos escolares, foram duas medidas que marcaram, definitivamente, uma ruptura no discurso da escola aberta e, principalmente, alargaram o fosso que separa a escola da comunidade que serve. Se o ME não deseja essa abertura, se os encarregados de educação não sentem a necessidade de participar na escola, o que poderá fazer a restante escola para envolver os cidadãos nas actividades escolares?

26 de junho de 2006

Fair-play

A sociedade actual é um palco onde se observam tentativas brutais de impor a vantagem pessoal em detrimento do interesse geral. Vivemos num tempo em que a ética parece ter emigrado para lugares que não conhecemos. A ideia que passa é que a comunicação social e a opinião pública em geral convivem com estranha naturalidade com os atropelos das regras morais. Argumenta-se, num estilo conformista, que a pressão dos resultados, a necessidade do lucro, as regras do mercado, marcam uma cultura de permissividade e que, portanto, há que saber viver com isso.

Observemos o desporto através de uma lente dirigida para a sua dimensão industrial e comercial. É neste quadro que as questões lançadas pelo mestre Jorge Bento fazem todo o sentido: Qual a razão para continuar a reclamar que o desporto seja um alterar de celebração do princípio do fair-play? […] Conseguirá o desporto sustentar-se como um espaço moral livre das influências sociais? Será capaz de manter a ilusão do fair-play na vida? Poderá configurar uma reserva destinada a garantir a sobrevivência de um axioma moral tão antigo?

Isto a propósito de uma ocorrência do jogo dos oitavos de final do campeonato do mundo de futebol - Portugal-Holanda – [estou certo que ainda fará correr muita tinta] interpretada por um jogador holandês que após uma paragem do jogo para assistência a um jogador lesionado se terá aproveitado da inacção dos jogadores portugueses, que esperavam que a bola fosse colocada fora do campo, para iniciar um contra-ataque.

Adenda: “O seleccionador de Portugal, Luiz Felipe Scolari, defendeu hoje que a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) deve avançar com um pedido de despenalização de Deco para o jogo contra a Inglaterra, argumentando que o jogador recebeu o primeiro cartão amarelo ontem, frente à Holanda, depois de a equipa adversária ter desrespeitado o "fair-play" preconizado pela FIFA.
Não estamos aqui perante um paradoxo do treinador da selecção? Ao mesmo tempo que se apela ao cumprimento dos princípios éticos encobrem-se outros valores que os ajudam a destruir.
Como quis vincar no corpo do texto: as acusações a violações da quebra dos princípios morais só servem para confundir os incautos.

25 de junho de 2006

Êxtases…

"As propinas são caras, admite a directora, mas a "enorme qualidade do ensino assim o exige", justifica. A escola não quer ter mais do que 20 estudantes por turma, para não perder o acompanhamento individual que é a sua marca, acrescenta. "Se baixássemos as mensalidades, teríamos de ter mais alunos nas turmas", sublinha."
[Blannie M. Curtis, directora do colégio St. Julian"s School, no Estoril in: Público25/06/06]

"A «justiça» e a «empatia» são os atributos que os alunos mais prezam no professor, segundo os relatos recebidos por Maria José Viseu, a quem também chegam ecos de docentes que não sabem ir além do que diz o manual. A sua «aprendizagem está bastante formatada e muito virada para o aluno médio, que é uma coisa que não existe», remata a líder da CONFAP."
[Visão, 22/06/06][O negrito é meu]

Hummm… educação personalizada, acompanhamento individual na sala de aula, recusa de um ensino direccionado para o aluno médio… estou a ver…
Procuro relembrar um tempo onde um representante da CONFAP viesse protestar no espaço público exigindo um ensino personalizado. Não tenho memória desse tempo. O que não deixa de ser estranho até porque o tema da redução do número de alunos por turma coloca pais e professores do mesmo lado e o ME do outro. Que razões forçam a CONFAP a ficar calada?

Adenda: A agenda da ministra da Educação.

24 de junho de 2006

(…) os pés pelas mãos…

"(Visão) Porque nunca aparece a referência ao termo «ensinar» no Estatuto, como criticou o professor Nuno Crato [Presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática]?

(ME) Não é verdade. Aparece várias vezes. Acho que as questões técnicas da pedagogia não devem vir para a esfera da actividade política. Podemos fazer um paralelismo com a área da saúde: seria o mesmo que o ministro da Saúde dizer qual a melhor técnica de diagnóstico para um problema de saúde." [Ministra da Educação, Visão (22/06/2006)] [o negrito é meu]

Li a entrevista e, excepto a novidade das escolas poderem vir a seleccionar os seus professores, não li nada de novo. Percebe-se a estratégia da ministra em repetir insistentemente as ideias do reforço do controlo das escolas e dos professores [com a cumplicidade dos meios de comunicação social] para que elas se incorporem nos discursos do senso comum. A meu ver, neste momento, já se confunde a notícia com a propaganda.

Mas não é sobre a entrevista da ministra que me interessa reflectir. Procuro apenas perceber o alcance daquela afirmação, aparentemente inócua, mas que reflecte a filosofia que subjaz à actuação desta equipa no ME.Se as questões técnicas [o ensino é uma técnica da pedagogia?] da pedagogia não podem vir para a esfera da actividade política, posso deduzir que as outras questões, a económica, a administrativa, por exemplo, é que devem ser as questões chave da política educativa, o que não deixa de ser, no mínimo, obtuso. Mas, a ser verdade que a ministra recusa a utilização de argumentos pedagógicos para legitimar decisões políticas, o que dizer da argumentação utilizada para justificar o encerramento das escolas do 1º ciclo?

22 de junho de 2006

Plano de acção para mais Matemática…

O anunciado Plano de Acção para a Matemática assenta em três eixos principais: Programa Matemática: Equipas para o sucesso; Promover a formação contínua em Matemática para professores de todos os ciclos; proceder à avaliação dos manuais escolares de Matemática. Em cada um destes eixos de acção são propostas várias medidas, presumivelmente bem pensadas e coerentes, mas que parecem sobreviver sem a presença do principal sujeito: o aluno.

Admito que este programa possa suprir lacunas na organização escolar, corrigir erros de formação académica, detectar falhas na concepção de manuais escolares, e por via disso tornar mais eficiente os processos de transmissão de conhecimentos na Matemática. Mas, talvez por não ser professor de Matemática, não acredito que este plano de acção para a Matemática [mesmo com a ajuda da disciplina de Português] resolva: a ausência de investimento pessoal nas actividades escolares; a depreciação do valor esforço na vida comunitária.

Observando alguns contextos de prática, noto que as dificuldades de aprendizagem decorrem da ausência de significado que os alunos atribuem às actividades escolares. É necessário questionar esta diferenciação de significado da actividade para o professor e para os alunos, apontando-se o interesse em proporcionar uma prática que permita ao aluno extrair o seu próprio significado.
Alguém acredita que um aluno investe um cêntimo do seu esforço numa matéria de ensino, fornecida em pacotes de disciplinas ou não, se ele não lhe reconhecer valor?
Como é que a escola, a pedagogia, a Matemática, lidam com o esforço?

Adenda: A escola do faz-de-conta produz, normalmente, resultados fantásticos. Para já são só rumores, mas começo a ficar impaciente enquanto aguardo pela evolução dos índices de retenção dos alunos… [e mais não digo] Antevejo uma prova clara da profícua colaboração dos professores com o ME.

Adenda II: Aceitam uma sugestão? É imperdível este debate. Ao longo de 18 minutos Carlos Pinto Coelho conversa com Cristina Batista, jornalista e responsável pela produção do dossier sobre violência escolar da revista «Pontos nos iis», João Sebastião, coordenador do Observatório de Segurança em Meio Escolar, Margarida Gaspar de Matos, professora, e Santana Castilho, director da revista «Pontos nos iis». Foi um debate realizado na TSF.

Está aqui: http://www.tsf.pt/audio/2006/04/noticias/09/directo9.asx

A escola para o séc. XXI

No blogue Inquietações pedagógicas tomei conhecimento da sessão de lançamento do Debate Nacional sobre Educação, organizado pelo CNE em colaboração com a Câmara Municipal de Setúbal e com o Instituto Politécnico.

O tema em debate é o seguinte:
Que saberes, que competências serão necessários para o cidadão do século XXI e como pode a escola promover essas competências com qualidade e equidade?

Se o Nuno Crato visitasse este blogue ficaria arrepiado com as considerações que vou fazer sobre o tema. E muito provavelmente, a sua visita não teria volta. Então vejamos porquê:

A realidade tem de manifestar-se na educação. E a realidade do séc. XXI exige uma educação virada para a aprendizagem constituinte que consiste no desenvolvimento da capacidade de produzir ou constituir conhecimento e não na de o receber já feito [Patrício]. Como diria o professor, cada vez menos teremos de dar o peixe, cada vez mais teremos de ensinar a pescar. E a escola pode promover as competências que serão desenvolvidas no confronto directo com as realidades através da escola cultural.

21 de junho de 2006

Produtividade…

Hoje cumpri o ritual de uma vigilância.
Haverá alguma função mais estúpida para atribuir a um professor? É assim que o Estado justifica o dinheiro que foi retirado do bolso dos contribuintes para a pagar a minha formação académica?
Estou varado!

20 de junho de 2006

Nó-górdio II

A avaliação dos professores ao ser transformada no nó-górdio do sistema educativo tornou-se, de imediato, conveniente para um conjunto de interesses, alguns deles opostos. Foi conveniente, desde logo, para o ME porque os holofotes da comunicação social ao incidirem num dos actores do sistema deixaram de aclarar a irrelevância e a incoerência de um conjunto de políticas que afectam o sector [e não estou a pensar apenas nas políticas educativas]. Foi conveniente para aquele tipo de encarregado de educação que vê na acção do professor o motivo da “crise da escola”. Foi conveniente para os órgãos de comunicação social que participam activamente nos movimentos de privatização da educação. Foi conveniente para aqueles órgãos directivos das escolas que reclamam mais poder e controlo para coagir e controlar professores inconformados. Foi conveniente para todos aqueles professores que estão fartos de serem molestados no circo mediático e confundidos com os prevaricadores. Foi conveniente para uma “elite” que se convenceu de que foram os únicos a passar por um sistema de “ensino a sério” e que uma das formas de purgar os males do sistema educativo passa pelo exame a uma classe profissional – os professores – pretensamente conivente com o agravamento da qualidade do ensino. Foi conveniente para todos os docentes que têm por hábito submeter as suas práticas ao veredicto dos alunos, pares e outros elementos da comunidade educativa.

Reunidas as vontades por motivos diversos, é certo, vamos então lançar um olhar para a avaliação contextualizada procurando que ela tenha significado para os avaliados e que se traduza em práticas de qualidade.

Adenda: Um outro modelo de avaliação.

Nó-górdio

A avaliação dos professores foi elevada a nó-górdio do sistema educativo. No contexto de várias discussões relativas ao controlo social da escola, a avaliação dos professores concentrou todas as atenções num momento em que começava a ganhar espaço, na opinião pública, a ideia da privatização da educação. Era necessário sacrificar a classe docente para calar os arautos neoliberais. E bem vistas as coisas, o mercado educativo convive muito bem com uma reduzida capacidade de intervenção dos professores e uma baixa capacidade de influência dos sindicatos.
Uma mão lava a outra!…

19 de junho de 2006

Ministra a (curto) prazo

Depois de ouvir a crónica dominical do professor Marcelo (PM) decidi escrever estas linhas. A ideia era subscrever a apreciação do reputado analista ao trabalho da ministra da educação e respectiva equipa. Como não foi possível saltar para o teclado nesse momento, adiei a empreitada até agora. A ideia é antecipar o futuro. Podem chamar a este exercício, que eu não me incomodo, futurologia. ;)
Quero acreditar que está para muito breve a renúncia da actual ministra da educação. Todos os ministros governam a prazo, eu sei, mas, neste caso, o prazo desta ministra será compulsivamente encurtado. Esta minha convicção decorre da análise conjuntural: das manifestações de desalento dos professores como uma reacção natural aos ataques sistemáticos a que têm sido alvo; da mudança lenta e gradual da opinião dos especialistas em generalidades e por arrastamento da opinião pública.
E já que estou no domínio da futurologia, posso mesmo adiantar um prazo: Basta observar este imbróglio pelo lado da agenda política, para verificar que a ministra deixará de tutelar o ministério da educação após a aprovação do futuro ECD, lá para Janeiro do próximo ano. Não sei se concordam comigo, mas noto alguma pressa do Eng.º Sócrates [basta observar o aconchego do primeiro-ministro e as manifestações de apoio] em arrumar o sector educativo, ou melhor, em poupar dinheiro no sector educativo. É um facto inquestionável que a ministra da educação fez um trabalho notável de contenção de despesas, apesar de ser ainda muito cedo para se avaliar o alcance das medidas restritivas. Uma missão deste tipo tem como consequência imediata a imolação da imagem da ministra. Se tudo correr como o Eng.º espera [digo eu], depois da casa arrumada, lá virá o momento de se encontrar um sucessor que faça as pazes com os professores e que os mobilize em direcção às questões educativas em vez de os mobilizar em direcção às questões corporativas [eu sei que é uma piada de mau gosto ;))].
É nesse momento que valerá a pena aquilatar o estado da memória dos professores…

18 de junho de 2006

Vai começar o nacional…

281 mil alunos têm-se preparado nas últimas semanas para mais uma época de exames nacionais.” [Público 18/06/06]
“6,5 milhões de euros é quanto custa o processo de exames.” [Público 18/06/06]

[…] A avaliação formativa não é uma prática recorrente nas escolas e nas salas de aula.
[…] Avaliar para classificar ou para seleccionar ou para certificar parecem ser as preocupações dominantes. Esta orientação tem gravíssimas consequências ao nível das qualificações dos jovens portugueses pois acaba por lhes transmitir desânimo e desmotivação e, mais grave ainda, leva a centenas de milhar de alunos à reprovação e/ou abandono, puro e simples, da escola.” [Fernandes, 2005]
Todas as modalidades de avaliação existentes têm o seu lugar no sistema de ensino. A dificuldade em conciliar as diferentes modalidades de avaliação e a manifesta prevalência de procedimentos característicos da avaliação certificadora e selectiva sobre os procedimentos formativos na sala de aula, leva-me a afirmar que a avaliação não está a ser assumida como um processo que serve para aprender. A avaliação não pode continuar a ser vista apenas como um instrumento de prestação de contas para as escolas e para os professores.

17 de junho de 2006

Autocrítica...

Olhar a mudança, sentir a mudança...

16 de junho de 2006

Ensino, Ministério de Educação & Professores

"O sentido não se decreta, não existe em nenhuma parte se não estiver em todo o lado" [Lévy-Strauss]
A animosidade intelectual do Ministério da Educação contra os professores e a quixotesca reorganização do sistema educativo a que se assiste (misturando teorias de management duvidosas, de enorme frivolidade, com mudanças de características pedagógica desajustadas, pouco rigorosas, ineficazes e de má fé) deixa as famílias, os pais, os encarregados de educação e os docentes à beira de um ataque de nervos. O economicismo pacóvio revelado pela tutela governamental não só põe em causa, definitivamente, todo o sistema educativo (já de si quebrado pelo recheio pedagógico do eduquês, curiosamente apadrinhado por esses mesmíssimos intervenientes e por quem os apoia cegamente) mas, pela afronta à civilidade e à inteligência de todos nós, compromete qualquer passo em frente no desenvolvimento económico do país.

A não ser que se tenha, exclusivamente, a intenção malévola de proporcionar passagens administrativas para inclusão nas estatísticas, não se consegue alcançar a bondade das medidas presentes na proposta de alteração do "Regime Legal da Carreira do Pessoal Docente" e o que consta do documento da "Política Educativa e Organização do Ano Lectivo 2006/07". São tantas as contradições e tão evidente a má fé, que julgamos que só razões do foro psicanalítico explicarão as inenarráveis reformas tomadas. O eduquês é só por si um mistério e, deste modo, o discurso oficial deixa de ter qualquer lucidez.

Incapaz, pela natureza própria do eduquês, de mudar a matriz curricular inadequada ao perfil dos alunos em diferentes Cursos (que o inefável David Justino instituiu), desistindo de reformar métodos e procedimentos curriculares e psico-pedagógicos, mostrando (e de que maneira infausta) que não está disposta a alterar o facilitismo educativo e o pouco rigor avaliativo (e que os professores, pela sua condição de funcionários, não controlam), introduzindo com requintes de malvadez o confronto entre docentes e entre estes e os pais, a equipa da senhora Ministra da Educação fomenta a agonia na Instituição Escola e presta um mau serviço ao país. A fuga à prática escolar lectiva e a desvalorização da componente pedagógica-curricular em troca de um economicismo inebriante, determinaram a necessidade da tutela configurar um maior controlo disciplinar e punitivo sobre os docentes, que estão assim reféns de si próprios e da perversidade das medidas ministeriais.

Não se pense que a voragem ministeriável iliba os vários e insanos discursos dos sindicatos sobre a Escola, a sua actividade lectiva e não-lectiva ou a avaliação do desempenho dos seus associados. Os sindicatos (evidentemente que não se refere, aqui, à FNE, dado ser um grupo de vassalos da quadrilha rotativa governamental ao longo de todos estes anos) contribuíram para a situação a que se chegou. Tantos anos sem qualquer preocupação de rigor pelo trabalho e avaliação dos professores teriam que levar a todo este desastre educativo, que se aproxima em grande exaltação. E quando se tem governos autoritários e incompetentes dum lado e sindicatos autistas de outro, nada se pode fazer. Infelizmente.

In: Almocreve das Petas.

15 de junho de 2006

?

Enquanto se fazem as contas ao deve e ao haver da greve, eu questiono se o direito à greve se transformou num direito apêndice ou, dito de outro modo, se a evolução do nosso modelo social se encarregará de o aniquilar?

Adenda: Quero felicitar a Carlinda Leite pela coragem que patenteou ao pronunciar-se, publicamente, sobre os ataques que têm sido desferidos à profissão docente. O “umbiguismo” de uma multidão de professores de cátedra não lhes permite seguir este exemplo.
[Obrigado, Teresa, pela sugestão]

Adenda II: Serviço público - Ensino: a destruição final [Almocreve das petas] [Via Reflectindo], Os professores estão de pé! [Jornal A Bola], Desmistificando o embuste da Ministra da Educação [Jornal da Madeira].

13 de junho de 2006

A colaboração em três actos…

Acto um
Vacilei antes de publicar este texto. É verdade que me sinto desconfortável a escrever, ou melhor, a publicar algo que se relacione com as minhas práticas ou projectos de trabalho. Talvez por pudor [ou por algum tipo de recalcamento (risos)], deixo este tipo de escrita guardada na secção dos rascunhos. A meu ver, é possível reflectir sobre as práticas sem necessitar de personalizar e de escancarar os contextos onde elas se concretizam. O risco de reduzir a realidade é enorme quando o olhar se limita a descrever factos e as situações do quotidiano sem a preocupação de desconstruir e reconfigurar essa mesma realidade. A realidade não existe no seu estado puro. É sempre uma reconstrução e uma reconceptualização. Por esse motivo, gorarão fracassadas aquelas tentativas de procurar um clone da realidade a partir destes textos. Como se diz em cinema: só por mera coincidência é que esta história se assemelha à realidade. Por isso, é uma perda de tempo procurar os actores locais até porque neste filme, a existirem, serão sempre meros figurantes.

Acto dois
O Atlas Desportivo Concelhio foi a actividade de referência para os alunos de um Curso Tecnológico. As matérias de ensino das disciplinas de formação tecnológica convergiram para a consecução da actividade da qual resultou um produto: Uma página da Internet/CD-ROM. Não é a avaliação do produto que me interessa relevar. Não estou, obviamente, a minimizar os resultados escolares, a desprezar os processos de prestação de contas ou relativizar as actividades que suscitam a expressão de competências. O produto serve para tudo isso e muito mais. Favorece a valorização da instituição escola na comunidade local, testa sistemas de comunicação internos, cria oportunidades de estágio aos alunos no 12º ano.

Estou mais interessado em reflectir sobre os processos de mobilização de vontades. Estou interessado em analisar: o efeito deste tipo de actividades na participação dos alunos, as dificuldades que se colocam ao trabalho de projecto, a desconexão entre a agenda escolar e a agenda comunitária [encarregados de educação, agentes económicos e recreativos]. Interessa-me, fundamentalmente, buscar na escola situada a essência da colaboração.

Acto três
O trabalho decorreu ao longo de dois períodos lectivos e foi uma consequência de um emaranhado de práticas colaborativas. Houve uma interdependência entre vários actores, no interior [docentes e alunos] e no exterior da escola [no município e nas colectividades desportivas]. Ao sair da escola, as iniciativas reclamam a conciliação de agendas de trabalho o que inviabilizou o cumprimento estrito do horário e espaço escolar. Garantido o respeito pelo crédito horário mínimo previsto para cada uma das disciplinas do curso, foi necessário tratar o espartilho legal com criatividade para que a rigidez normativa não dificultasse o trabalho cooperativo [cf. textos anteriores].
Foram definidos perfis de liderança para os diversos sub-projectos e criadas as condições para que a actividade se desenvolvesse em piloto automático. Como? Através do apelo ao envolvimento e à colaboração voluntária de vários colegas [é bom relembrar que a escola é uma organização riquíssima já que congrega nos seus quadros uma diversidade de licenciados dispersos por vários grupos disciplinares e que viabilizam a escola pluridimensional]. Ao procurar o cerne da cooperação não é fácil destacar um ou dois aspectos decisivos. Creio que não estarei muito longe da verdade se assinalar a persistência das várias lideranças e a confiança nas pessoas e nos processos.

Alargando o foco: Lideranças e confiança!...
Não se favorecem as lideranças com cotas de acesso! Não se conquista a confiança dos docentes desqualificando-os em praça pública!

12 de junho de 2006

Avaliações...

“Nem tudo o que a escola converteu no currículo em ritos relevantes o é na realidade e nem tudo o que desconsidera é irrelevante.” [Sacristán, 2002]

11 de junho de 2006

Discursos demagógicos sobre a colaboração…

Nos dois textos anteriores dedicados à colaboração procurei enfatizar uma ideia: o ME ao exigir dos professores uma atitude colaborativa não está a ser totalmente sincero quanto ao seu empenhamento retórico no fortalecimento do professorado.
E esta minha convicção saiu reforçada depois de ler o documento de revisão do ECD: O ME delega nos professores a responsabilidade da implementação das mudanças, obrigando-os a prestarem contas a esse respeito e, ao mesmo tempo, atribui-se a si próprio a responsabilidade [centralizada] pelo desenvolvimento dos objectivos através de normativos que incidem sobre o currículo e avaliação. O que se verifica é que os processos de planificação e de concepção estão separados dos processos de execução.
Seria bom que os professores e as escolas [através dos seus órgãos directivos] denunciassem esta incongruência e reclamassem o poder de conceber e planificar. Só que esta exigência implica descentralizar e devolver o poder às escolas e aos professores. E como todos nós percebemos, o discurso hegemónico actual vai no sentido contrário: A desacreditação dos professores e delegação da culpa dos resultados escolares na escola. Para quê? Para que o poder continue reservado a alguns.
Não é uma pena que sejam os alunos a pagarem a factura destes jogos de poder?

10 de junho de 2006

Colaboração com significado…

Um dos objectivos da avaliação do desempenho é “favorecer o trabalho colaborativo dos docentes, orientado para os resultados escolares.(Artº 41 da proposta de alteração do ECD)
As mudanças introduzidas na escola, externa e centralizadamente, não dispensam a colaboração dos professores. Os administradores precisam de assegurar a mobilização dos docentes e utilizam formas mais ou menos coercivas para seduzir os mais renitentes [A recente proposta de alteração ao ECD por exemplo]. É uma colaboração compulsiva, não voluntária, orientada mais para a implementação das mudanças do que para o desenvolvimento dos professores. A inflexibilidade deste tipo de colaboração faz com que os professores se alienem em cenários escolares simulados para as exigências administrativas e, por essa razão, pouco interessantes e adequados às necessidades reais das escolas.
Pelo facto da colaboração assumir formas muito diversas e produzir resultados distintos em função do significado que lhe é atribuído, do ponto de vista do administrador nem sempre é desejável que os professores colaborem se se perceber que dessa colaboração resulta uma comunidade de professores que podem seleccionar as inovações a adoptar numa escola situada.
Mesmo entre pares, há distintas compreensões sobre o significado da colaboração. A colaboração é entendida como o ensino em equipa, diálogo profissional, investigação-acção em colaboração, treino com pares, etc., etc. E cada um destes significados tem implicações distintas na interdependência dos professores. Uma conversa informal na sala de professores, uma partilha de material e recursos, o receber ajuda e assistência de um colega, são formas de colaboração que não requerem uma estreita interdependência entre colegas. Ora, por tudo isto é que a colaboração deve ser voluntária, orientada para o desenvolvimento, difundida no espaço e no tempo e imprevisível.
Perceber este tipo de colaboração nos documentos oficiais é um exercício falacioso.

A carta do Ademar...

Carta aberta e quase íntima à Ministra da Educação...

Minha Cara Maria de Lurdes Reis Rodrigues

Nos tempos que correm, você é, digamos, a face visível do meu patrão, o Ministério da Educação. Não me sinto, porém, "seu" empregado; sinto-me seu igual. Sou também, como você, professor (há mais de duas décadas), tenho, de vida, alguns anos a mais do que você (para infelicidade minha), escrevo e publico poesia (e sempre gostei de partilhar poesia com os meus alunos, apesar de não ser professor de Português ou de Língua Portuguesa) e, talvez diferentemente de você, quando entrei para a Faculdade, não planeava ser professor, mas jurista. E, antes de ter optado por ser professor, fiz outras coisas na vida: fui tradutor, fui assessor jurídico, fui advogado, fui jornalista, fui gestor comercial. E tenho três filhos, dois dos quais estão ainda no ensino básico e em escolas "públicas", quero dizer, escolas "do Estado". Tenho pensado, escrito e publicado "alguma coisa" sobre educação, currículo que, infelizmente, não lhe reconheço.
Não sei, por isso, francamente, entre nós, quem terá mais autoridade para falar de educação e de ensino. Claro: você é a Ministra da Educação: tem autoridade política. Mas não era desta "autoridade" (circunstancial) que eu falava. Referia-me a outra: aquela que decorre da reflexão, da experiência e do interesse (não profissional, corporativo ou político, mas "civilizacional").
Tenho, diante dos meus olhos, um Despacho assinado por si, datado de 7 de Junho (ou seja, de anteontem). Está para publicação no Diário da República. Estabelece (transcrevo-o) " regras e princípios orientadores a observar, em cada ano lectivo, na elaboração do horário semanal de trabalho do pessoal docente" (...), "bem como na distribuição do serviço docente correspondente". Define ainda " orientações a observar na programação e execução das actividades educativas que se mostrem necessárias à plena ocupação dos alunos dos ensinos básico e secundário durante o período de permanência no estabelecimento escolar".
Não quero discutir consigo o conteúdo do Despacho. É, simplesmente, mais um Despacho, uma fórmula legislativa que os episódicos governantes deste pobre país gostam muito de usar para dar a entender (coitados!) que sabem e que podem. Não leve a mal que a desiluda: de Despachos Ministeriais (bem ou mal intencionados) está o inferno (e Portugal) cheio. Em mais de duas décadas, não sei de nenhum Despacho que tenha, efectivamente, contribuído para mudar a qualidade das aprendizagens dos nossos alunos (quero dizer: dos nossos filhos).
Você sabe tão bem quanto eu: precisamos de professores qualificados, profissionalmente autónomos e responsáveis e motivados. Mas não acredite que os crie por Despacho. E com Despachos como este, e com todas as declarações que tem vindo a fazer sobre os professores (e não discuto sequer se com razão ou sem ela), só tem conseguido, liminarmente, uma coisa: humilhar e desmotivar os professores em geral, os competentes e todos os outros.
Escolheu, imprudentemente, o caminho errado. Porque você ainda não percebeu que não basta ter autoridade política para "mandar" e para "mudar". É preciso suscitar a paixão, o entusiasmo, a clarividência, o pundonor. E, nesta arte, você tem-se revelado, lamento muito escrevê-lo, completamente incompetente. Conseguiu apenas fazer-se odiar (pelas melhores e pelas piores razões). Não vejo, sinceramente, como o ódio que, actualmente, os professores lhe devotam poderá contribuir para a felicidade dos meus filhos.
Lamento muito (repito) escrever isto, porque até comecei por simpatizar consigo. Continuo a considerá-la uma pessoa bem intencionada. Mas, porventura mal aconselhada, errou o método e o alvo. E agora já é muito tarde para voltar atrás e reganhar a confiança daqueles que deveriam ser os seus principais aliados.
Com toda a franqueza e com toda a frontalidade, entre colegas, permita-me que lhe diga: acho que deveria demitir-se e dar o lugar a outro. Talvez ao António Nóvoa, agora o seu Reitor, se ele estivesse disponível para colar os cacos que deixou (infelizmente, não acredito que quisesse). Pena que, em devido tempo, não se tivesse aconselhado com ele...

8 de junho de 2006

Colaboração por decreto…

Um dos objectivos da avaliação do desempenho é “favorecer o trabalho colaborativo dos docentes, orientado para os resultados escolares.(Artº 41 da proposta de alteração do ECD)
Quando estou na disposição de colaborar e de trabalhar em conjunto ponho-me de feição aos parceiros. É como se participasse numa espécie de ritual de acasalamento. O trabalho em conjunto que requer uma interdependência mais estreita entre colegas tem implicações ao nível da autonomia e expõe concepções individuais sobre práticas. Esta forma de colaboração permite revelar crenças, evidenciar fragilidades e demonstrar o controlo ou a ausência dele sobre o processo de auto-formação.
Como refere Hargreaves, “não existe uma colaboração ou colegiabilidade «real» ou «verdadeira», mas unicamente formas diferentes de colaboração e de colegiabilidade, as quais têm consequências diferentes e servem propósitos diversos”.
Qual é o significado que eu atribuo às práticas colaborativas? Afinal, quem é que guia e controla o significado da colaboração?

Adenda: Despacho - Organização do ano lectivo 2006-2007

Adenda II: Professores mais faltosos terão mais trabalho depois das aulas.

Líder forte em organização fraca.

Um dos objectivos da avaliação do desempenho é “favorecer o trabalho colaborativo dos docentes, orientado para os resultados escolares.(Artº 41 da proposta de alteração do ECD)

A cultura de colaboração tem sido uma esperança dos administradores no combate ao individualismo e um factor promotor do desenvolvimento profissional. O ME nunca disfarçou o interesse em seduzir as lideranças das escolas de forma a garantir a promoção das práticas colaborativas. O caminho pareceu-me acertado na medida em que era necessário envolver e inspirar as pessoas para a alteração de práticas e isso só seria possível com a energia e o entusiasmo dos líderes das escolas. Se a direcção do passo foi a mais correcta o mesmo não poderei dizer do alcance da passada. Se houvesse um conhecimento profundo da organização escolar, nunca seria negligenciada a participação dos restantes líderes que existem, efectivamente, nos mais variados níveis. A ideia de que uma instituição forte corresponde um líder forte é uma ideia que não tem qualquer sustentabilidade numa sociedade de conhecimento tanto mais que a regeneração de líderes individuais com as qualidades desejáveis é muito difícil.

O passo dado pelo ME foi curto e por muito poder que deposite nas mãos dos presidentes dos conselhos executivos o resultado é previsível: a promoção da colaboração artificial!
E a colaboração artificial não é mais do que um tentáculo da escola do faz-de-conta!

Adenda: A reunião sindical teve uma única consequência: trouxe mais cor ao olhar.

Primeiro levaram os comunistas,
mas eu não me importei,
porque não era nada comigo

Em seguida levaram alguns operários,
mas a mim isso não me afectou,
porque eu não sou operário.

Depois prenderam os sindicalistas,
mas eu não me incomodei,
porque nunca fui sindicalista.

Logo a seguir,
chegou a vez dos padres,
mas como eu não sou religioso,
também não liguei.

Agora levaram-me a mim e,
quando percebi,
já era tarde

Bertolt Brecht
[Obrigado, f...]

6 de junho de 2006

As evasivas

O recente anúncio de uma greve de professores fez despoletar o tradicional processo de alienação nas salas de professores. É um momento triste em que são reveladas debilidades ao nível das capacidades volitivas muito bem disfarçadas por discursos risíveis e inconsequentes.
Será que o problema da classe é a falta de classe?

Adenda: Serviço público no Reflectindo: Uma viagem pela imprensa.

[Imagem: Daniela Reis]

[Obrigado, Isabel]

4 de junho de 2006

Uma questão de fé…

A proposta do ME foi reduzida a uma proposta de avaliação do desempenho pela comunicação social e pelos sindicatos de professores, por razões diversas e que não vou aqui aprofundar. O que está em jogo com uma proposta deste tipo é muito mais do que isso: É uma ideia de escola que está implícita neste documento e que não foi ampla e suficientemente debatida. A meu ver, a metodologia adoptada pelo ME para introduzir este debate é errada na medida em que não se pode escolher o perfil de professor para uma escola que não se conhece. Mas, não é só uma questão metodológica que me faz divergir da acção do ME. Desagrada-me a ambiguidade do discurso dos actuais inquilinos do ME, que fazem passar para a opinião pública a ideia de que são necessárias novas missões para a escola sem que se defina uma estratégia global [envolvendo outros ministérios] para atacar de forma integrada os diversos problemas educativos. As novas missões são remetidas à escola como quem endereça postais de Natal [cf. discurso de António Nóvoa no parlamento]. Pena é que a bondade destes discursos acabe por promover o afastamento da escola real da escola publicitada.
Mas, quem é que define e gere este quadro de missões? É o governo? É a força política que circunstancialmente chega ao poder? Será compreensível deixar os professores à margem desta discussão? Será exequível alargar o conteúdo funcional do professor sem atender à tipologia das missões/singularidade das escolas? Como é que estas mudanças são recebidas na escola? Alguém acredita ser viável a mudança das escolas sem provocar mudanças substantivas nos actores que as promovem? Qual a influência das mudanças legislativas nas práticas dos professores?

A ministra tem afirmado, insistentemente, que o documento que agora foi divulgado é apenas uma proposta e, como tal, é susceptível de ser alterada. Todos os ministros fazem afirmações deste tipo antes de se sentarem à mesa de negociações.
Teremos razões para acreditar na boa-fé negocial? É que esta questão tem de ser respondida antes de nos metermos a caminho para, em conjunto, encontrarmos soluções.

3 de junho de 2006

Têm algum tempo?

Então, ouçam este cromo da TSF... até ao fim.

Adenda: Encontrei uma nova sala de aula em Setúbal. Bem-vindo, Alberto.

Adenda II: Domingo, às 22.30h na 2, a convidada do programa é a Ministra da Educação. Também pode ser ouvida aqui http://www.rr.pt/noticia.asp?idnoticia=167037 [obrigado emn].

2 de junho de 2006

“A carne é fraca”

"O Conselho Executivo da Escola EB 2,3 Inês de Castro, em Coimbra, demitiu-se, alegando que, "devido ao estado de desmotivação dos professores provocado pelas declarações da ministra da Educação, não se encontram reunidas as condições para promover o plano delineado com vista à promoção do sucesso" dos alunos." [Público de hoje]

Garantido o apoio incondicional das associações de pais ao focalizar unicamente na acção dos professores a maior responsabilidade pelos maus resultados escolares dos alunos, o ME necessitou do apoio dos conselhos executivos para fazer passar uma imagem de harmonia e estabilidade para a opinião pública. Era necessário passar à opinião pública a ideia de que as reacções dos professores eram reacções corporativas, usuais nas organizações que sentem a perda de privilégios. Esta manobra foi muito bem concedida, sob o ponto de vista táctico naturalmente, pela equipa de 5 de Outubro. Depois, e ainda procurando “dividir a classe para reinar”, foi necessário envolver os professores mais antigos do quadro de escola colocando-os numa função de silenciador ou amortecedor das reacções adversas que a proposta de alteração do ECD suscitaria quando fosse conhecida pelos docentes. A ideia de que os professores mais antigos fariam parte da elite docente alimentaria o ego destes professores e a lógica “umbiguista” faria o resto.

Ora, é neste ponto em que nos encontramos: Estamos muito próximo do golpe final que é a desqualificação [proletarização] da função docente se o documento que foi apresentado não sofrer uma metamorfose.

É por tudo isto e por estarmos neste ponto, que a acção isolada [e que grande coragem demonstraram os docentes do conselho executivo da Inês de Castro, caros colegas] terá sido uma pedrada no charco na estratégia do ministério da educação, que tudo tem feito para que os conselhos executivos, os grandes guardiães da classe docente, garantam uma estabilidade apodrecida nas escolas. Infelizmente, não existirão muitos mais exemplos deste tipo a assinalar porque “a carne é fraca”.

1 de junho de 2006

Elos…

O documento que se propõe reformar o Estatuto da Carreira Docente tem sido objecto de discussão intensa. Conversas mais ou menos acaloradas, mais ou menos fundamentadas, como seria de esperar, ninguém ficou indiferente às novas propostas. Embora as reacções de desagrado diversifiquem de tom, a apreciação global do documento é consensualmente negativa. Arrisco mesmo a afirmar que todos os docentes se consideram perdedores neste processo. Uns por razões mais egoístas, outros por motivos mais altruístas, a generalidade dos professores não aprovaria o documento se viesse a ser submetido a um referendo interno. E não será necessário um exercício de futurologia para prever esse resultado pelo facto de pressentirmos que é inevitável um agravamento das condições de trabalho que decorre da proletarização da função docente.

O sentimento colectivo é de que algo terá de ser feito. E ao contrário do que tem sido feito, há que procurar demonstrar a insatisfação protestando e propondo alternativas. Firmemente!
Este é o momento de nos aglutinarmos em torno da defesa de um ofício. Se aprendemos com os erros do passado recente [e não preciso recuar mais de um ano] não nos dispersaremos com questiúnculas em torno das questões acessórias: a avaliação da (in)eficácia da acção sindical e a emergência da criação de uma ordem de professores. E estas questões são acessórias porque há um tempo para tudo. E este não é o tempo para nos desviarmos do que está verdadeiramente em jogo: a defesa da profissão.

A proposta do ME é má. É um documento que não tem coerência interna: aposta numa ideia de excelência e restringe a progressão dos professores que revelam práticas de excelência usando o filtro das cotas de acesso à carreira de elite [professores titulares]; apela à responsabilidade colectiva da organização escolar [apela com um cutelo no pescoço] e estimula o individualismo e a colaboração artificial; incrementa o conteúdo funcional e restringe a autonomia do profissional prescrevendo rotinas e intensificando o trabalho,…

O que fazer no curto-prazo? Agir na construção de alternativas: Dinamizar a discussão intra-muros aclarando o essencial do documento em análise e abrir fóruns de discussão alternativos [a blogosfera é um meio excelente]; Produzir propostas concretas fundamentadas remetendo-as para as estruturas sindicais dos professores [não nos podemos esquecer que os sindicatos são os nossos representantes legítimos nas negociações com o ME] e para o ME [é essencial mobilizar os conselhos pedagógicos e as assembleias de escola para que prevaleçam as propostas colectivas].

Adenda: Acabei de ouvir a parte final de uma entrevista da Ministra da Educação na SIC notícias. Como interpretar a ligeira inflexão no discurso?

Adenda II: A Teresa disponibilizou-nos um documento fantástico e que merece ser lido nas salas de professores. Está aqui.