31 de outubro de 2004

Falta de lucidez?

Diz a notícia que “a ministra da Educação pretende reforçar o ensino do português e da matemática no 1º ciclo do ensino básico através de um número mínimo de horas lectivas. O objectivo da tutela é prevenir o insucesso e abandono escolar.”

Há qualquer coisa de obscuro nesta notícia. A forma aligeirada como surgiu indicia um resultado inconsequente. É que esta gente parece não aprender. Crêem que a mudança no sistema se resolve com um clique, com o anúncio de uma medida e com uma resma de decretos.
Na verdade, já estávamos avisados. O PNAPAE indicava a criação de um Plano de Português Língua Não Materna, de um Plano de Promoção da Leitura e da Escrita e de um Plano específico para o Apoio ao Ensino e Aprendizagem da Matemática. Será que os tais Planos se restringem ao aumento da carga horária nas duas disciplinas (mais 45 minutos para cada uma) em detrimento de algumas disciplinas não curriculares, como é o caso da área de projecto ou do estudo acompanhado? Aguardarei pelo desenvolvimento da iniciativa. Mas, se observarmos o enunciado da notícia fica a ideia de que a medida é avulsa e emerge de um equívoco conceptual na medida em que circunscreve o insucesso escolar a duas áreas disciplinares, de forma unilateral e redutora. Por outro lado, o conceito de insucesso escolar é multifacetado e demasiado abrangente para ser suprimido, exclusivamente, pela instituição escolar. O que não deixa de ser irónico é que, enviesadamente, a famigerada área de projecto (uma metamorfose da área escola) corre o risco de ser decapitada.
Que bom seria se os clubes escolares renascessem das cinzas para ocupar o seu lugar no sistema educativo, digo eu.

PS: Descobri no Profidências o Síndrome do Contraditório II. É mais do mesmo.

28 de outubro de 2004

Educar a saúde.

Abro daqui a porta para uma discussão no Educar para a Saúde. Esta entrada “da Aptidão Física associada à Saúde” e esta “da educação física...um desafio” motivaram este comentário:
Aproveito esta nova entrada do meu amigo Miguel para dirigir a minha lente na seguinte direcção:
O corpo e o estilo de vida são fundamentais no cultivo da saúde, como tem sido amplamente demonstrado neste espaço. Por essa razão a saúde deixou de ser um assunto restrito da medicina e passou a ser também um assunto da educação. À Escola incumbe a tarefa de colaborar na formação de uma consciência moral e social no que se refere à construção de projectos de vida que incorporem esta noção. Confrontada com inúmeros paradoxos e debilidades, inclusive as questões associadas à educação da saúde, a Escola procura(?) o seu lugar e o seu papel no mosaico social do qual emerge. É a partir deste enquadramento que relanço a eterna questão de saber se a Escola se deve submeter às necessidades singulares do aluno e organizar-se tomando como quadro de referência a sua pessoa ou persistir na sua inglória tarefa de considerar o aluno massa como organizador do quadro de acção de todo o sistema educativo. Nesta matéria, como em muitas outras, encontrámo-nos na mesma carruagem.
Embora entenda o alcance das questões relativas à direcção da “nossa” área disciplinar e as implicações que daí advêm no que concerne à influência exercida no estilo de vida nos alunos, seria aceitável que a problemática dos valores, da co-educação, do ambiente, etc. surgissem a reivindicar a centralidade na abordagem disciplinar. Obviamente que esta reorientação será ainda mais aceitável quando se parte do pressuposto que todas estas questões poderão ser compatibilizadas.
Mas, não posso finalizar o comentário sem deixar de reconhecer as minhas incertezas no que diz respeito ao grau de influência da escola e, particularmente, da Educação Física sobre o estilo de vida dos alunos
.

Acrescentarei uma breve nota ao comentário. Há que estimular a investigação científica agora que sobram as questões dignas de interesse para as Ciências da Educação e, em particular, para as Ciências do Desporto. O Educar para a Saúde tem sido um excelente campo de treinos. Aguardarei pelo novo estádio.

27 de outubro de 2004

A falência dos documentos orientadores?

As minhas correrias no dia-a-dia escolar percorrem várias frentes. Recentemente deixei-me envolver num grupo de trabalho que discutiu um projecto curricular. As razões que me levam a participar nestas equipas são conhecidas.
Há, no entanto, uma questão que não me larga o pensamento:
Se os documentos orientadores oficiais não induzem alterações substanciais nas práticas docentes, porque é que insistimos na manutenção das “velhas” rotinas que conduzem a resultados iníquos?

24 de outubro de 2004

Mudança do (no) interior...

A mudança não é, em si, boa ou má. Serão os sentidos e os fins que lhe determinam a essência. Estou convicto que mudar a Escola será um propósito iníquo se cada um descurar o seu posicionamento dentro da instituição. Apelar à mudança do contexto sem ousar a mudança de si próprio é, no mínimo, incoerente. O sentido da mudança terá de ser, a meu ver, de dentro para fora. É assim que eu me procuro posicionar na vida. É assim que eu me situo na profissão que escolhi.
Isto a propósito das duas últimas entradas relativas à sala de professores. Dirigi o meu olhar para a metamorfose da escola situada. Considero que uma educação personalista e uma escola cultural exigem do professor uma grande disponibilidade. Não será este o momento para discorrer acerca do perfil do professor cultural. É o tempo de procurar soluções, de agir. Não é o tempo de carpir as mágoas pelo rumo da educação. É nesta medida que irei, sem qualquer propósito moralista e hipócrita, enunciar um conjunto de medidas básicas que nortearão a minha conduta. Para alguns serão inócuas, para mim serão um ponto de partida:
  1. Estar disponível para trabalhar com todos, alunos, colegas e órgão de gestão;
  2. Dar o primeiro passo, de forma inequívoca, em direcção ao diálogo;
  3. Relegar para segundo, terceiro ou quarto plano as quezílias pessoais;
  4. Estar de vigília à exequibilidade das ideias, planos e iniciativas que se orientem para a uma concepção de escola cultural.

As salas de professores não podem continuar como dantes!


23 de outubro de 2004

Sala de convívio versus sala de trabalho.

A insuficiência, e em muitas escolas a ausência, de espaços e meios adequados ao trabalho em equipa ou ao trabalho individual gera nos professores um sentimento de impotência, de inoperância e de frustração. A sala de professores e a biblioteca transformam-se em portos de abrigo para os professores que procuram rentabilizar os seus tempos de preparação. Na linha do que refere o Gustavo, será que não existem alternativas menos convencionais, com outra configuração espacial, com arranjos menos “convivenciais”? Sabendo como os contextos determinam as relações interpessoais, será que a adopção de uma lógica de funcionamento da organização escolar subordinada à expressão da dimensão técnica do profissionalismo docente não alteraria o cenário do palco onde se joga o poder? Claro que sim. Contudo, como refere e bem o Manuel, “acabar com um qualquer espaço de visibilização deste mapeamento político e social implica que ele apenas se deslocalize”. Estas duas perspectivas de olhar a organização escolar não se excluem. Enfatizam um ou outro aspecto caracterizador da cultura escolar. A metamorfose de uma escola situada será, a meu ver, “a grande questão”.

22 de outubro de 2004

Gente nova na sala de professores.

Saúdo dois novos colegas nesta sua aparição pela blogosfera. O Carlos com a Didáctica da invenção e o Jorge com o Profidências.
Outros olhares…

Professores na sala.

Esta entrada do Manuel traça um quadro cinzento de uma sala de professores. É um retrato muito familiar que enfatiza uma vertente lúdica mas não deixa de suscitar uma reflexão mais cuidada. A sala de professores mais do que um ponto de encontro e um espaço de socialização é um lugar de reanimação, um centro homeostático e um lugar de culto. É também um palco onde se desenrolam jogos de poder que são decisivos para o crescimento da instituição. Uma sala de professores é um espaço vital para se conhecer a singularidade de uma cultura escolar.
Esta entrada do Manuel é um pretexto para um olhar profundo dirigido à escola.

21 de outubro de 2004

Não seria de esperar outra coisa: Máquina nova, havia que lhe puxar o lustro, instalar os acessórios que lhe dão um toque pessoal, criar o tal ambiente de trabalho acolhedor. Com esta azáfama toda acabei por me deixar isolar, de passar ao lado dos portos de abrigo, de navegar ao largo.
Recuperarei este atraso assim que sopre uma aragem, logo que lance um outro olhar.

20 de outubro de 2004

Aviso…

… aos navegantes:
Ontem andei, literalmente, às voltas com a máquina. Abandonei o “velho mini” para me sentar aos comandos de um “cintilante ferrari”.
Que este me acompanhe na busca da transcendência. Que cada um de nós cumpra o seu propósito!

17 de outubro de 2004

Academismos?

Não se trata de maldizer um evento que, a meu ver, deve ser divulgado, participado e repetido. A escola é uma organização extraordinariamente rica para justificar a investigação aplicada, para merecer a reflexão de académicos e dos seus actores principais, para produzir conhecimento não se limitando a reproduzi-lo.
O I COLÓQUIO DE SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO EDUCACIONAL a realizar nos dias 05 e 06 de Novembro do corrente ano na Universidade do Minho conta com um painel de ilustres especialistas nacionais. João Barroso, Licínio C. Lima, Stephen Stoer, etc. fazem parte desse grupo de académicos que garantirão o nível do debate e do encontro.
Tal como aconteceu no último Prós e Contras televisivo referente ao Estado da Educação, o saber de experiência feito será desprezado.
Onde estarão os homens do terreno, nomeadamente, os presidentes dos conselhos executivos?
Na plateia!?

15 de outubro de 2004

Um novo olhar...

...prenúncio de um fim-de-semana agitado.

14 de outubro de 2004

Os falsos argumentos.

Fragmentos da entrada anterior:
Uma área disciplinar ou disciplina é relevante do ponto de vista social, é imprescindível para o desenvolvimento integral do aluno, é singular no sistema educativo.
Então poderei concluir que esta disciplina é a mais valiosa. E que os seus profissionais deverão ser os mais bem pagos? Ou não?

Homo Sportivus

Este post de José Gustavo no Paixão da Educação surge como uma resposta a uma sugestão da colega Saltapocinhas do Fábulas. A colega dizia o seguinte: "Eu acho que os professores, ao contrário do que acontece hoje em dia, não deviam ganhar todos o mesmo. (...)Um professor de Matemática, ou Português ou Ciências, etc. devia ganhar mais que os professores de EVT ou de Educação Física e afins."

Depois de ler os argumentos do José Gustavo aconselho vivamente uma visita ao Paixão da Educação. Reconheço-me nessa cosmovisão e subscrevo integralmente a sua resposta. Como tal, irei olhar para esta problemática de forma enviesada. Parafraseando o professor Jorge Olímpio Bento (um homem que dedica muito da sua vida ao estudo do Homo Sportivus), quando me chamam ou querem fazer de mim burro aproveito logo para dar um coice.

Sim, sou um professor de Educação Física. Olímpio Bento diria que me ocupo, pois, da forma humana. Porque o acto desportivo constrói e revela o homem por dentro e por fora. À unilateralidade de outras expressões da cultura corresponde o desporto com a mobilização e empenhamento total da pessoa.

E uma vez mais, continuámos a ter de provar que a disciplina de Educação Física é relevante do ponto de vista social e por isso há que reafirmar a imprescindibilidade no sistema educativo.
Recupero um texto que escrevi em Janeiro do corrente ano porque ainda se mantém actual. Dizia que a reorganização curricular do ensino básico e, mais recentemente, a reorganização curricular do ensino secundário tocou em algumas feridas que nunca chegaram a cicatrizar. Não se trata de qualquer fervor corporativo impulsionado por sentimentos de vencedor ou perdedor. Portanto, não estou preocupado se o estatuto dos professores da minha área disciplinar decresce ou melhora. São questões menores que nos fazem atrasar no caminho.

A questão central é que há uma redução da carga horária semanal na disciplina de Educação Física no ensino básico e secundário quando é consensual para os especialistas nesta área disciplinar que a actividade física dos alunos na escola é insuficiente para as suas necessidades. Por outro lado, tocam os sinos a rebate quando os estudos nacionais e internacionais alertam para os problemas cada vez mais preocupantes da obesidade e excesso de peso da população infanto-juvenil enquanto que nós assobiamos e olhamos para o lado, disfarçadamente.

A legitimação escolar da disciplina de Educação Física passa por explicitar a sua incumbência educativa e, como tal, há que recorrer a um conjunto de perspectivas, nomeadamente:

  • Uma fundamentação antropológica que acentue a relevância do domínio motor e corporal para um conceito integral de educação na escola;
  • O significado do desporto na vida social e individual, justificando plenamente a necessidade de preparar as crianças e jovens para intervirem neste sector;
  • Acentuação das potencialidades específicas que o desporto encerra para corresponder às necessidades de formação, educação, desenvolvimento da identidade e autoconceito dos adolescentes.

Decorre a partir destas considerações, que o argumento central a favor da presença da Educação Física e do desporto dentro do conjunto das disciplinas escolares é o facto de ser a única disciplina que visa preferencialmente a corporalidade.

Podem ser enunciados outros argumentos que justificam as vantagens da sua presença ou as desvantagens da sua ausência na escola, nomeadamente:

  • A compensação dos aspectos negativos inerentes às outras disciplinas e à organização escolar;
  • A necessidade de aprender desporto na escola para poder participar fora dela;
  • O desenvolvimento da personalidade e da capacidade de rendimento geral, da saúde e do bem-estar;
  • A aquisição de valores do fair-play, do respeito, da consideração e da tolerância;
  • A formação de um estilo de vida que desempenhe uma função relevante, no âmbito de uma estratégia de prevenção de comportamentos desviantes.

Os argumentos poderão ser estes. Nenhuma escola do futuro pode desprezar a pessoa que é o aluno. E uma escola agride o aluno se não cuidar da sua corporalidade.

Será que esta discussão configura um quadro de balcanização disciplinar?
Esta praga que ainda se mantém entrincheirada nas escolas, continua corroendo o que resta de bom no sistema educativo – as relações humanas?

12 de outubro de 2004

Um olhar mais intimista.

Com o tempo e à medida que o caminho se faz, cresce a cumplicidade entre os companheiros viagem. Como um ferrete, os estados de alma emergem na escrita de cada um. Decifrar emoções e sentimentos é um esforço que só valerá a pena se olharmos a blogosfera a partir de uma perspectiva holística. Blogues sérios, enigmáticos, temáticos, intimistas, reflexivos, irónicos, colectivos, etc.
Aqui, as tertúlias adquirem outra plasticidade.

9 de outubro de 2004

O que diz? O que faz?

A desordem que usurpou o ME não terá permitido à Sra. Ministra da Educação anunciar o que pretende fazer. Presumo que o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Educativa e o Sr. Secretário de Estado da Educação, pelas mesmas razões, não tenham tido oportunidade de dizer o que pensam e o que pensam fazer no sector.
Só por respeito aos professores que se viram envolvidos na teia da colocação de professores, alunos e famílias que foram defraudadas por um sistema educativo iníquo (com rosto) e defensores da escola pública é que não vou implorar o silêncio.
Não quero crer que esta equipa não seja capaz de olhar mais longe, que se limite a decalcar o plano disparatado que foi traçado pela sua antecessora, que prossiga a sua caminhada pelos atalhos da gestão corrente.
Enquanto é anunciada uma medida avulsa que decorre da agenda da comunicação social, nomeadamente, o apoio que será dado aos estabelecimentos de ensino “mal classificados” nos famigerados “rankings”, há uma revisão curricular no ensino secundário que avança descontroladamente e sem qualquer discussão. Paralelamente às questões suscitadas pela revisão curricular em curso temos que regressar aos “velhos” problemas: A estruturação do ensino pré-escolar e a generalização da oferta a todo o território nacional; O controlo dos grupos económicos que gravitam em torno dos problemas educativos, nomeadamente, o sector livreiro e o mercado paralelo das explicações; O eterno divórcio entre o ensino superior e o ensino básico e secundário; A (in)acção dos conselhos municipais da educação e a previsível municipalização da contratação de professores; A clarificação do enredo “processo de Bolonha” e as ramificações que advêm para o ensino “inferior”; O inconsequente Plano Nacional de Prevenção do Abandono Escolar; etc., etc.
A página oficial do ME contém mais do mesmo. Bom, há que aguardar até que a Sra. Ministra diga (faça) qualquer coisa.

8 de outubro de 2004

6 de outubro de 2004

Saiu o tiro pela culatra?

Raramente sintonizo a TVI. Da sua programação destaco dois dos seus programas por razões bem diversas: Os jogos de futebol do glorioso que ocupam aquele espaço dedicado à emoção e à paixão dispensando qualquer acrescento de razão; E o jornal da TVI quando é coadjuvado pelo professor Marcelo. Sobre o meu primeiro destaque não tecerei qualquer comentário porque sem esta coisa do desporto a vida não nos chega, não nos satisfaz. Contudo, a vida “séria” tal e qual ela nos é apresentada pela informação diária sofre tantas distorções quantos os olhares que sobre ela são perspectivados. Isto é, os acontecimentos não nos chegam no seu estado “puro”. Vão sendo decompostos, reconstruídos, filtrados. Os Marcelos da nossa televisão ampliam a representação da vida. Não sei se a diluição das fronteiras entre a informação e o espectáculo não terá impulsionado um novo paradigma jornalístico? É, porventura, um assunto que suscitará novos olhares.
Voltando à programação da TVI e ao jornal de domingo. Habituei-me a ouvir o professor Marcelo e sempre achei graça ao seu estilo douto e ligeiro. Aprecio a agilidade com que aborda os assuntos e a acutilância dos comentários mais do que a substância das suas opiniões. Pela minha parte, os dirigentes do seu partido escusavam de ter provocado a saída do professor do mediatismo televisivo quando ele virou o bico ao prego.
Será desta que o feitiço se virará contra o feiticeiro?

5 de outubro de 2004

Restolhos do “ranking”

1. Efeito:
A divulgação pública dos resultados dos alunos nos exames nacionais do 12º ano alimenta aquele tipo de discurso que António Nóvoa designou de discurso de responsabilidade. A meu ver, é um discurso que só terá sentido e utilidade se o seu objectivo for identificar situações problemáticas e criar condições para a sua resolução.
Longe do barulho, há que meter as mãos na obra.

2. Analogia:
Os especialistas do treino desportivo sabem como preparar os atletas para as grandes competições. Os resultados dos atletas serão irremediavelmente comprometidos se não forem respeitados os princípios biológicos do treino.
O princípio da reversibilidade assegura que as mudanças funcionais e morfológicas adquiridas pelo treino são de natureza transitória.
Ninguém ficará surpreendido com o desfazamento entre resultados obtidos numa dada competição e posteriores desempenhos.

4 de outubro de 2004

“Ranking”

A divulgação dos resultados dos alunos nos exames nacionais do 12º ano e os olhares suscitados por este acontecimento mediático reflectirão as expectativas dos órgãos de comunicação social, bloguistas, pais, professores, etc., acerca da escola.
É um pretexto para falar da escola e da sua enorme complexidade. É uma nova oportunidade para que cada um fale das suas crenças, ideologias e utopias. Na maior parte dos casos o que se escreve sobre o assunto não poderá ser levado a sério. A falta de rigor e a ligeireza das generalizações hipotecam a seriedade da análise. Porque estamos numa época de ordenações, aguardarei a publicação de outros “rankings”: Do civismo, da autonomia, da solidariedade, do rendimento desportivo, da saúde, do grau de satisfação dos actores educativos, das relações da escola com o meio, etc. O mais importante é saber quem são os melhores e os piores alunos, as melhores e as piores escolas.
Num outro quadrante bem distante, as escolas e os conselhos pedagógicos não podem ficar indiferentes aos resultados dos seus alunos nesta competição nacional. Há que interpretar os resultados utilizando os critérios que, em cada contexto escolar, sejam mais adequados para retractar essa realidade singular.

Como dizia, cada um de nós enfatizará da publicação das listas o que mais lhe convier. E já que falei de análises enviesadas aproveito para fazer a minha. Encontrei o segredo do sucesso para as escolas que pretendam atingir os primeiros lugares do ranking. “Um estilo de ensino assente na harmonia das relações interpessoais e num quadro docente estável com 99% dos professores no quadro. [...] Um projecto educativo que transforme a escola numa comunidade educativa e numa verdadeira escola cultural.” [in: Expresso 2/10/04]

1 de outubro de 2004

Quebrou o verniz.

Ontem, assisti a um momento hilariante numa palestra dedicada ao fenómeno desportivo. Dois dos convidados, defendendo abordagens diferentes de uma dada realidade, deixaram-se envolver numa discussão estéril, frequente nos debates partidários televisionados, desencadeando uma onda de reacções na plateia, como se de uma conversa de café se tratasse. Ausência de civilidade, autismo intelectual, arrogância científica, foram os atributos da cena que noutro contexto poderia ser legitimada.
Um exemplo. Sabemos que o confronto de ideias, de interesses, de objectivos pessoais, pode ser suscitado em qualquer jogo ou competição desportiva onde os praticantes apreendem a viver nas franjas da emoção, nos excessos que advêm dessa prática. O radicalismo do jogo acaba por fazer manifestar traços da personalidade dos praticantes que só se expressam nas situações limite. Basta observarmos os confrontos de amigos nos encontros de fim-de-semana, nos campos de ténis, pavilhões gimnodesportivos, campos de futebol, etc., para nos certificarmos que é possível renegar a inteligência. Porém, esta revelação só está ao alcance desses grupos restritos. Aí também se quebra o verniz.