"[…] o problema educativo já não pode ser reduzido ao simples insucesso de uma mão-cheia de alunos, por mais numerosa que seja essa mão-cheia, nem sequer à circunstância de a escola não cumprir satisfatoriamente as missões precisas que a comunidade lhe encomenda, mas revela-se de uma natureza preliminar e mais sombria: da incerteza ou da contradição presentes nas exigências correspondentes.
Deverá a educação preparar competidores capazes em vista do mercado do trabalho ou formar homens completos? Deverá potenciar a autonomia de cada indivíduo, muitas vezes crítica e dissidente, ou a coesão social? Deverá desenvolver a originalidade inovadora ou manter a identidade tradicional do grupo? Atenderá à eficácia prática ou apostará no risco criador? Reproduzirá a ordem existente ou instruirá os rebeldes que possam vir a arruiná-la? Manterá uma neutralidade escrupulosa perante a pluralidade das opções ideológicas, religiosas, sexuais e as outras diferentes formas de vida (droga, televisão, polimorfismo estético...) ou esforçar-se-á por demonstrar o preferível e por propor modelos de excelência? Poderão visar-se em simultâneo todos estes objectivos ou serão alguns deles incompatíveis entre si? Neste último caso, como e quem deverá decidir das escolhas a fazer? E outras perguntas aparecem, irrompendo na base destas e minando, por vezes, os alicerces que as fundamentam: será obrigatório educar toda a gente do mesmo modo ou devem existir diferentes tipos de educação, segundo a clientela-alvo? Será a obrigação de educar um assunto público ou antes uma questão privada que tem a ver apenas com cada um de nós? Haverá a obrigação ou sequer a possibilidade de educar todos e cada um, pressupondo-se a universalidade da capacidade de aprender? Mas vejamos: porque há-de ser obrigatório educar? […]" [pp. 20-21]
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