18 de março de 2007

Contra a Maré

Crónica

A quem pertence a escola (pública)? A pergunta de Perrenoud (2002)(1) não é inócua, principalmente num momento em que se verifica uma crise na escolarização.
Em Portugal, na época contemporânea, a escola foi quase sempre pertença do Estado. No entanto, a evolução científica, tecnológica, económica e social fez emergir, como uma força crescente, um paradigma que se consubstancia na afirmação do poder da "sociedade civil" face ao poder do Estado. De um Estado que tudo controlava em matéria de educação (e não só) passou-se para uma "sociedade civil" onde grupos de pressão com exigências cada vez maiores começaram a questionar as funções do Estado, reclamando uma diminuição dos seus poderes, tornando difusa a sua identidade. Hoje, a escola pertence à "sociedade civil". É o mesmo que dizer que a escola pertence ao poder económico. Não é por isso surpresa para ninguém que a formação profissional seja o cerne escolhido da mudança do sistema educativo e não é menos surpreendente que os discursos políticos incorporem conceitos como os de qualificação e certificação, elegendo-os à condição de objectivos do Governo. Esta obsessão da formação para a profissão acaba por perverter a função primordial da escola que é a formação humana dos educandos. A formação técnica e profissional dentro da "escola geral" (convém diferenciá-la da escola profissional) relega para um plano secundário a formação geral e a factura só será paga no momento em que o sujeito evidenciar fragilidades sob o ponto de vista cultural, isto é, quando o sujeito for confrontado com mudanças na configuração do mercado de trabalho. Não podemos desprezar a volatilidade da empregabilidade e os apelos para a aprendizagem ao longo da vida, cujas consequências são tudo menos ingénuas e despiciendas.

Se a escola não é capaz de preparar - tout-court - os indivíduos para o mercado de trabalho (e será que essa formação na totalidade lhe cabe?) por que razão não a libertamos do espartilho da formação profissional e lutamos pela criação de condições para a imersão cultural dos educandos?

(1) Perrenoud, P. (2002). Aprender a negociar a mudança em educação. Edições ASA. Porto.

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