19 de setembro de 2005

O professor operário

Após o comentário do João [entrada mais em baixo] decidi recuperar este artigo de opinião [provocador q.b] do Dr. Daniel Sampaio.

"A lista de professores
As recentes decisões do Ministério da Educação não suscitaram apoio significativo da maioria dos docentes. Percebe-se que assim seja: a premência política do anúncio, motivada pela necessidade de apresentar algo de positivo num comício após as férias, prejudicou o debate sereno da iniciativa ministerial. Teria sido preferível que as novidades fossem comunicadas aos professores e pais no início da próxima semana e no seu ambiente próprio: a escola. A verdade é que estas medidas podem alterar o clima de muitos estabelecimentos de ensino. Por exemplo, a decisão de atribuir aos Conselhos Executivos (CE) a responsabilidade da fixação dos professores às escolas, de modo a aproveitarem os tempos sem aulas para outras actividades, pode ser de uma importância decisiva no apoio aos alunos.
Muitos críticos entendem que os professores não podem ser obrigados a estar na escola, porque lá não possuem o mínimo de condições de trabalho. Em casa, estudam melhor, preparam aulas e testes, até reflectem mais sobre o ofício de ensinar. Como poderão apoiar os alunos em escolas degradadas, sem espaço, sem gabinetes disponíveis, sem bibliotecas modernizadas e, sobretudo, sem a "orientação" do Ministério? No intuito de contribuir com algumas ideias, meras sugestões de ocupação dos professores para o período em que deverão estar na escola sem aulas, aqui deixo uma lista de possíveis actividades docentes:
1. Reunião informal do Conselho de Turma. Local: recanto da Sala de professores. Encontro de docentes de uma turma para discussão de problemas, definição de estratégias, aferição de métodos.
2. Atendimento de alunos. Local: mesa do refeitório ou sala de aula disponível. Horário: uma hora por semana, sempre no mesmo dia. Ouvir os alunos, detectar problemas e encaminhar para soluções. Articular com Director de Turma (DT) e psicólogo, caso exista. Incentivar na escola a criação de Mediadores escolares, já existentes em alguns locais.
3. Apoio a alunos com dificuldades escolares. Locais: mesmos do ponto 2. Encontros com alunos para tirar dúvidas, incentivar pesquisa, aconselhar novos métodos de estudo. Pode evoluir para aulas mais sistemáticas de disciplinas em défice de aprendizagem.
4. Atendimento de pais, para além do escasso tempo que o DT costuma atribuir a esta tarefa. Local: sala de aula disponível, recanto do ginásio. Os pais gostam de conhecer os professores dos filhos e querem colocar questões a que o DT não sabe responder.
5. Decoração da escola. Local: corredores mal pintados e cheios de comentários, paredes dos pátios, salas de aulas degradadas. Em articulação com os professores de Desenho, constituição de grupos de alunos e de professores para feitura de quadros, painéis, azulejos.
6. Organização de debates, exposições, vinda de personalidades à escola. Local: recanto da Sala de Professores, recanto do ginásio. Com a colaboração dos alunos e a partir das suas ideias, obtidas através de uma "Caixa de Sugestões".
7. Conversa com Auxiliares de Acção Educativa. Local: mesa do funcionário, recanto do corredor. Para discussão de questões de disciplina e dos problemas da escola.
8. Conversas com os alunos sobre a escola. Local: ginásio. Incentivar os alunos a participarem na vida da escola, ouvindo-os sobre o seu quotidiano escolar. Aceitar as suas sugestões construtivas e encaminhá-Ias para o CE. Organizar assembleias de Delegados de Turma.
Muitas mais ideias poderão surgir. O que é essencial é que os docentes entendam que ser professor é muito mais do que dar a matéria e corrigir testes!"

Daniel Sampaio
XIS do Jornal O Público de 17 de Setembro

[O negrito é meu]

Será que este texto [não o dissocio das medidas que o suscitaram] fez despoletar o alarme da dignificação da função docente?

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