O recente contrato de autonomia celebrado entre a Escola da Ponte e o ME introduziu actualidade à questão – projecto educativo [um]a face da autonomia. Ao longo do último ano, alguns dos bloggers [os colegas Manuel, Miguel, Adkalendas, Carlos, Ademar e Gustavo (?)] que tratam nos seus blogues a educação do básico e secundário já se dedicaram a analisar o assunto, com mais ou menos profundidade. Ainda recentemente, o professor Varela de Freitas do blogue A memória flutuante prometeu lançar um novo olhar depois de aflorar, levemente, o tema no texto “Uma escola de sucesso”.
Aproveito para regressar ao assunto no primeiro dia de um novo ciclo para a escola portuguesa. Não me atrevo a pensar [hoje] que será mais do mesmo. Não quero acreditar que as lições do passado caíram em saco roto. Quero pensar [porque também acredito no Pai Natal, Manuel] que as escolas e os seus actores desejam agarrar o leme do seu futuro [e garanto que esta frase não foi retirada da boca de um demagogo].
A realidade educacional portuguesa não se afasta da tendência de alguns países que adoptaram a metodologia de projectos como um dos vectores essenciais na concepção, planificação e realização de diversas actividades em distintos níveis de funcionamento. A noção de projecto na vida das organizações traduz uma vontade de identificar o sentido da acção colectiva em função das expectativas futuras.
Atendendo à elevada difusão de projectos nas organizações somos forçados a questionar se estamos perante uma moda, se a elaboração dos projectos se deve a imposições legais [projecto decretado], ou se o projecto não constituirá um processo e um instrumento necessário a uma maior qualificação do funcionamento e do desenvolvimento organizacional.
Os inúmeros projectos pedagógicos (dos mais sectoriais, temáticos, adstritos a uma disciplina ou turma, muitas vezes situados numa determinada sala de aula, aos mais interdisciplinares e que cruzam determinadas valências e intervenientes da escola) são um bom exemplo de como o conceito de projecto presente nos discursos dos responsáveis pela Administração foi adoptado nas escolas.“(…) A existência de desarticulação, de conflitualidade, de situações anárquicas e artificiais, a instabilidade e a imprevisibilidade que grassam no seio das organizações, devem ser motivo para se procurar novas formas de organização que minimizem aqueles efeitos.” (Costa, 2003: p.1326)
Se os diversos projectos de escola manifestam um elevado dinamismo pedagógico nas escolas, a construção dos projectos educativos levam-nos a equacionar uma concepção dos estabelecimentos de educação e ensino em que a coerência organizacional e o sentido estratégico constituam referências básicas a uma escola mais autónoma, participada e localmente integrada (Ibid.: p.1321).
“Em Portugal não existe uma política deliberada de incentivo à elaboração do projecto de escola, apesar de ele aparecer referido com a designação de projecto educativo no decreto-lei nº 43/89 (autonomia dos estabelecimentos de ensino), no decreto-lei nº 172/91 (reforma de administração e gestão de escola)” (Barroso, 1992: 43) e no decreto-lei nº 115-A/98 (regime jurídico de gestão e administração escolar).
Os planos de actividade, projectos individuais ou de grupos de professores, mais específicos ou gerais, mais ou menos implícitos, raramente conseguem vencer a própria compartimentação do funcionamento tradicional da escola. Estes projectos, promovidos por minorias de activas, como João Barroso (1992) as designa, não são, muitas vezes, formalizados, nem se integram num processo muito estruturado. Por força dos vários conflitos com a Administração e das resistências geradas por outros elementos da escola, estes projectos desaparecem pelo desgaste e pelos efeitos de conjunturas desfavoráveis. A ausência de instrumentos eficazes de planificação é uma das razões, segundo o autor, para o insucesso, desperdício de energias e de frustrações.
O movimento da escola cultural é um ícone do desajustamento entre o delineado e o concretizado. Não obstante os apelos da Comissão de Reforma do Sistema Educativo (CRSE) , a Escola Cultural não foi introduzida por uma lógica mutacional dialéctica simultaneamente ascendente e descendente, inequivocamente centrada no trabalho educativo concreto, ou seja, no trabalho educativo que se realiza na escola (Patrício, 1996: p.42).
Se “ter um projecto de escola é ter um alvo estratégico, uma ambição, uma visão de futuro, assente em princípios, valores e políticas que se aplicam na acção educativa e pedagógica com os alunos” (Barroso, 1992: p.38), teremos razões objectivas que nos afastem do paradigma pedagógico que foi proposto pela CRSE a que se deu o nome de Escola Cultural? Dito de outro modo, tendo em conta os erros do passado e atendendo aos inúmeros constrangimentos normativos, será inexequível um projecto de gestão que assente as suas bases no paradigma pedagógico da Escola Cultural?
[Extracto de um texto submetido a publicação num jornal temático.]
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