As imagens recolhidas no interior de uma sala de aula da Escola Secundária Carolina Michaelis foram amplamente divulgadas por diversos meios de comunicação social. Ouvi declarações esotéricas da pedopsiquiatra Ana Vasconcelos, no noticiário da SIC, e do presidente do conselho de escolas Álvaro Almeida dos Santos, na RTP1, e tenho acompanhado as reacções na blogosfera.
O lamentável episódio foi dissecado e explicado sob diversos pontos de vista. Independentemente do ângulo de análise, o caso realça uma degradação do estatuto social do professor. Independentemente da proximidade da lente de análise [mais centrada no conflito concreto; ou mais focada na relação entre o Estado e os pais/comunidade], o professor surge como o elo mais fraco na relação dos alunos com o saber, ou na relação do Estado com os pais/comunidade. Este episódio permite-nos perceber, também, que no conjunto de interpretações sobre os fenómenos de ensino há uma tendência para desvalorizar o saber dos professores a favor de um determinado saber científico. Ontem foi a intervenção de uma pedopsiquiatra, hoje foi interpelado o presidente do conselho de escolas [o presidente do conselho de escolas decidiu assumir um papel de manga de alpaca... é o "saber científico de um burocrata"], outras vezes é a explicação de um sociólogo, e raras vezes a explicação de um professor.
Se por um lado estes episódios parecem retratar um sentimento generalizado de desconfiança em relação às competências e à qualidade do trabalho dos professores, alimentado por um conjunto de intelectuais e políticos que dispõem de um importante poder simbólico nas actuais culturas de informação, por outro lado encontramos sondagens de opinião que confirmam que o prestígio da profissional docente permanece intacto. Há, de facto, um entendimento consensual na sociedade de que o desenvolvimento exige um investimento na educação e que os professores são indispensáveis.
Há aqui um paradoxo que pode ser explicado pela existência de uma separação clara entre uma visão idealizada e uma visão concreta do ensino. António Nóvoa vê nesta falha o “epicentro da crise da profissão docente, que pode ser útil se a soubermos apreender na sua acepção original (krisis = decisão), assumindo-a com um espaço para tomar decisões sobre os percursos de futuro dos professores.”
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