4 de setembro de 2006

Outroolhar no olhar do outro

A estocada
4 de Setembro de 2004


A desvalorização da profissão docente tem sido uma constante na última década e meia. Os beneficiários desta degradação profissional não serão certamente os alunos, as famílias, o estado, a sociedade. Serão pequenos grupos que, circunstancialmente, ganham com a conjuntura. Há que desvendar os rostos daqueles que se escondem por detrás de uma ideologia que prevaleceu na modernidade e que não enxerga o alcance destas mesquinhas lutas sectoriais. Políticos obcecados pelo poder, jornalistas acólitos, pseudo liberais que só clamam pelo Estado quando a desgraça lhes bate à porta. Por seu turno, os professores do ensino básico e secundário assistem com uma incompreensível letargia à redução salarial, ao empobrecimento das condições e intensificação do trabalho, às consequências nefastas da proliferação sem critério de cursos de formação inicial com qualidade duvidosa. Uma nova estocada na dignificação profissional do professor sobressai do recente concurso de professores. Paradoxalmente, os obreiros desta cabala ideológica derramam lágrimas de crocodilo quando pressentem má qualidade na formação que é ministrada aos seus educandos. As vozes que reclamam a renovação dos incentivos (essencialmente financeiros) nos sectores fulcrais da administração pública de forma a atrair os melhores quadros do sector privado manterão esse mesmo argumento quando se apelar ao incremento de qualidade no sistema educativo?”

É verdade que hoje, passados dois anos, tenho muito pouco a acrescentar.
Embora a desvalorização da profissão pareça irreversível, o exemplo dos países nórdicos faz-me acreditar que ainda é possível garrotear o problema. E a desvalorização da profissão docente reflecte o modo como o nosso país, singular obviamente, olha a educação. Não caiamos no logro de pensar que elevação da qualificação se resolve cobiçando modelos, práticas e formas de organização,… dos países onde tudo parece funcionar. O problema da qualificação passa por reconhecermos, em primeiro lugar, que este sistema [caótico… ingovernável… e outros rótulos do género que lhe queiram atribuir] só funciona connosco. É com estes alunos, professores, encarregados de educação e auxiliares da acção educativa que se resolve o nó górdio do sistema educativo.

Isto a propósito da acesa discussão que as três últimas entradas geraram. Nós… somos professores no acto educativo. Teorizamos, discutimos, reflectimos, experimentamos, comparamos, bradamos, sofremos, insultamos, rimos, desabafamos,… tudo o que vivermos se reflecte no acto educativo. Em que medida? Não sei, nem me importa saber… Há um palco onde nos revelamos verdadeiramente como profissionais da educação - o acto educativo, que será sempre singular! “Bloguemos” bem ou mal, perfilhemos correntes pedagógicas requentadas, expressemos crenças mais ou menos excêntricas, nada do que aqui dissermos permitirá avaliar a natureza do acto educativo em que nos entregamos.

Dito isto, deixo o meu [habitual] desafio: treinemos a tolerância; aproveitemos esta sala de professores e este excelente auditório que nos permite cavaquear sem pedir licença para crescermos na profissão.

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