“Um grupo de empresários, dez nomes ligados à banca, ao retalho, à indústria farmacêutica, à construção civil, enfim, a sectores fortes de uma economia nacional não tão forte assim, apresentou ontem o que chama de "Empresários pela Inclusão Social". […] O grupo de destacados empresários portugueses propõe-se apoiar os professores a reduzir o abandono escolar.
[…] será criada uma associação sem fins lucrativos, que apoiará os docentes na melhoria da sua performance, de forma a combater o abandono escolar.
A forma de o fazer em concreto e o montante que será investido ficaram por revelar. Este novo "movimento" tem prevista uma conferência de imprensa para o início da próxima semana.”
Dizia um prezado amigo [que infelizmente e por razões que não são para aqui chamadas, só de forma periclitante vai tecendo a sua opinião sobre a coisa educativa] que não considera normal o silêncio daqueles que defendem a escola e a sua profissão diante da notícia supracitada; e que é por estas e por outras idênticas que progressivamente os professores são considerados meros e simples instrumentos, umas vezes prescindíveis, outras necessários apenas como meio para fins de outros.
Aproveito este desabafo para lançar um breve olhar sobre uma das grandes dificuldades do professorado, enquanto classe organizada, que é a de fazer prevalecer a sua agenda na opinião pública. É claro que não estou certo que o professorado tenha alguma agenda e se algum dia a terá. O que se tem passado é que as acções dos professores estão reduzidas a simples reacções, mais ou menos espontâneas, às medidas anunciadas pelo executivo ou às notícias criadas pelos órgãos de comunicação social. A agenda dos professores, a existir, decorre da agenda política que é marcada pela subordinação das questões educativas às questões económicas. Nem os sindicatos nem as restantes associações profissionais representativas dos professores têm conseguido antecipar-se ao governo e parecem sucumbir à hecatombe legislativa que arrasta as discussões para lugares comuns, até porque esta é a forma mais fácil e conveniente mas não necessariamente íntegra [para o poder político obviamente] de tratar os assuntos sociais.
Ora, é neste quadro que os professores necessitam de filtrar as temáticas que importam tratar. Há que olhar para o pantanal noticioso e procurar separar o trigo do joio. Há que separar a propaganda do que é, na perspectiva dos professores, informação relevante.
Regresso agora ao comentário do meu amigo para o enquadrar nesta reflexão. A notícia que eu acabei por destacar, motivado pelo desafio, merece ser analisada com algum cuidado. Quando a esmola é grande o pobre desconfia, lá diz o ditado popular. Quando os empresários decidem dar mostras de altruísmo é preciso verificar no tempo o modus operandi. Por outro lado, ainda tenho bem fresca a memória do famoso PNAPAE que não nasceu do movimento dos empresários mas do próprio ME. Recordo a publicidade a que foi sujeito o referido programa e os resultados alcançados estão aí, à vista de todos. Depois, olhando com acuidade para a notícia, é no mínimo estranho que os empresários apoiem os professores e não o ministério da educação no combate ao abandono escolar. Que diabo, sem a mediação do ME de que vale aos professores o apoio dos empresários? Sem a anuência do ME e a implicação dos seus responsáveis políticos, os professores pouco ou nada poderão fazer porque os constrangimentos na sua acção têm sido incrementados em vez de diminuídos.
Melhorar a performance dos professores para combater o abandono escolar significa precisamente o quê? Como disse atrás, há que aguardar pelos próximos capítulos desta iniciativa. Para já ficam as [boas] intenções entre muitas outras anunciadas e que pereceram por aí.
1 comentário:
Parece-me que os empresários estão interessados em sub contratar escolas ou docentes, numa perspectiva de "apoio interessado", para formatar mão-de-obra adequada a certos empreendimentos, ao mesmo tempo que fazem publicidade às suas empresas.
Este esquema coloca a educação DENTRO do processo de reprodução do capital, uma vez que condiciona, quer a gestão das próprias escolas "patrocinadas", quer os currícula e as "competências" que é suposto os alunos-formandos aprenderem.
Como de costume, basta procurar o que já se faz nos EUA e Canadá nesta matéria, para entender a "generosidade" dos empresários.
Trata-se de criar McEscolas ao bom estilo de gestão e produção de "competências" = Perrenoud+Bill Gates+Mc Donald's.
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