8 de janeiro de 2006

O regresso às turmas de repetentes

O despacho normativo nº1/2006, esta semana publicado em Diário da República, define (um) «percurso curricular alternativo» para os alunos do ensino básico sem sucesso escolar ou com problemas de adaptação. Estes alunos vão ter turmas com currículos próprios a partir do próximo ano lectivo, definidos pelas escolas, uma medida do Ministério da Educação para combater o abandono escolar.

Esta medida legislativa suscita a discussão em torno de uma problemática que tem sido central nos discursos políticos e pedagógicos – a exclusão escolar. Nos últimos anos, a “retórica inclusiva” tem sido ineficiente na resolução dos problemas da exclusão e até seria paradoxal que a escola se transformasse no oásis inclusivo num deserto de exclusão social que marca o mundo contemporâneo. O problema da exclusão encontra-se fora e dentro da escola. E medidas legislativas avulsas dirigidas à escola serão sempre inconsequentes enquanto não coexistirem com efectivas políticas de redistribuição. Mas, de facto, a escola continua a ser um motor de exclusão. João Barroso(1) reduz, de um modo esquemático, as formas de exclusão produzidas pela escola a quatro modalidades:
A escola exclui porque não deixa entrar os que estão fora.
A escola exclui porque põe fora os que estão dentro.
A escola exclui 'incluindo'.
A escola exclui porque a inclusão deixou de fazer sentido
.”

Este despacho enferma de um mal. Ao mesmo tempo que aponta o caminho da diversidade de oferta coarcta a iniciativa comunitária ao definir uma forma de organização exclusiva: "Estes currículos destinam-se a grupos específicos, com um mínimo de dez elementos, de alunos até aos 15 anos de idade, que configurem casos de insucesso escolar repetido."

Nota de rodapé maior do que o corpo do texto: (1) […] "No primeiro caso, a exclusão está relacionada com a ‘desigualdade de oportunidades’e realiza-se através de mecanismos sobejamente conhecidos, como sejam: a influência das diferentes origens sociais dos alunos nos seus percursos escolares; a estruturação da oferta educativa em função de factores económicos, culturais e sociais; a falta de apoios diferenciados; a hierarquização dos graus, etc. No segundo caso, a exclusão está relacionada, fundamentalmente, com as questões do insucesso e abandono escolares.
Quanto às duas últimas modalidades, elas são mais subtis e não têm merecido a mesma atenção dos investigadores e cientistas da educação. No caso da "exclusão pela inclusão", o que está em causa, sobretudo, é a imposição de modelos de organização pedagógica e padrões culturais uniformes, o que agrava o desfasamento entre a oferta e a procura escolares. No caso da "exclusão pelo sentido", assistimos aos efeitos de um confronto de lógicas heterogéneas de "consumo" escolar em que muitos alunos não encontram na escola um sentido para a sua frequência, quer ao nível do saber partilhado, quer ao nível da sua utilidade social, quer ainda como quadro de vida.
Ainda que estas quatro modalidades de exclusão sejam determinadas por muitos factores exógenos à escola (políticas educativas, economia e organização social), existem factores endógenos que contribuem grandemente para a sua existência e/ou para o agravamento dos seus efeitos. Entre estes últimos, são de destacar os factores organizacionais, não só os que estão relacionados estritamente com o trabalho pedagógico, mas também os que estruturam a escola no seu conjunto, enquanto organização, e regem as relações entre os seus diferentes intervenientes (administração, professores, alunos e suas famílias)."

[Barroso, J. (2003). Factores organizacionais da exclusão escolar – A inclusão exclusiva. In: David Rodrigues (Org.), Perspectivas sobre a inclusão. pp. 25-36. Porto Editora, Porto.]

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