24 de agosto de 2005

Persistir no analfabetismo motor

A discussão que se seguiu ao alargamento do horário escolar no 1º ciclo do ensino básico incidiu nas vicissitudes da oferta do Inglês. As restantes actividades de complemento curricular [os clubes escolares e o desporto escolar por exemplo] nunca mereceram o destaque que lhes é devido porque vivemos num tempo em que só existe o que é mediático. Malogradamente, os problemas da educação motora das crianças e jovens portugueses só entram nos cardápios das preocupações dos (ir)responsáveis políticos quando associados às notícias da epidemia da obesidade infanto-juvenil: casa arrombada trancas na porta. Presumo que o tempo para uma discussão séria sobre esta matéria não tardará. [O RSS do Público alerta-me, neste momento, para a existência de um debate público sobre obesidade infantil na Polónia: "Coca-Cola vai retirar refrigerantes das escolas básicas". Sugiro uma visita ao blogue Educar para a Saúde.]

Durante o curto período em que se esgrimiram argumentos sobre as consequências do analfabetismo linguístico e da emergência do domínio da língua de sua majestade, desejei que a discussão sobre o Inglês rebocasse o problema do analfabetismo motor que afecta, gravemente, a população infanto-juvenil. Esperei que emergisse, por via da discussão sobre as actividades de complemento curricular, o problema das actividades curriculares. Aguardei que o Ministério da Educação, embalado por um acesso repentino de seriedade na discussão dos problemas educativos, fizesse cumprir o “obrigatório”, o curricular, e deixasse para outras núpcias o que é facultativo, o que complementa o currículo obrigatório.
Creio que as minhas expectativas saíram goradas. Presumo que nunca poderia sair satisfeito porque fui castigado por um problema de entendimento [benigno], uma desarrumação qualquer que não me permite compreender o que é o curricular, o complemento curricular, o extracurricular, o lectivo e o extralectivo. Será, porventura, um problema meu. Adiante.

Deixando para trás os equívocos conceptuais, olho para o quadro em que se desenvolvem as actividades físicas no 1º ciclo. Mais importante do que saber se é obrigatório ou facultativo é saber de que modo o Estado garante o desenvolvimento integral dos nossos alunos. É apenas disso que se trata. E uma Escola que não ultrapassar os obstáculos que se colocam ao desenvolvimento das actividades físicas desportivas não pode ambicionar a oferta de actividades do desporto escolar. E que obstáculos são estes? Refiro-me aos eternos problemas que tardam em ser debelados:

  • A tipologia da grande maioria dos edifícios das escolas do primeiro ciclo não proporciona as condições mínimas para um trabalho sério na área das expressões psicomotoras;
  • Nem todas as autarquias perseguem o critério de qualidade na contratação dos recursos humanos porque seleccionam professores coadjuvantes de Educação Física pouco qualificados [a baixo custo];
  • A formação de banda larga dos professores do 1º ciclo, numa escola excessivamente intelectualizada, acaba por relegar para segundo plano as áreas das expressões.

A atalho de foice é possível relançar a reflexão sobre o papel da escola no desenvolvimento do desporto português porque já se percebeu que o Associativismo Desportivo não é capaz de responder às necessidades manifestas do país desportivo real [cf. Jorge Araújo in: Horizonte, nº 119, p. 34].

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