21 de abril de 2005

O faz-de-conta das assembleias de escola.

Um colega de escola, visitante regular deste espaço de conversa, sugere a leitura de um texto do Público de hoje (cf. correio dos leitores). A actualidade e a pertinência do assunto merecem outro destaque. Olhe para o seu microcosmos e procure as semelhanças.

"O faz-de-conta das assembleias de escola.

No preciso momento em que se escreve estas linhas, em centenas de escolas e agrupamentos escolares do ensino básico e secundário, está a decorrer o processo eleitoral para a assembleia, um órgão criado em 1988 onde se encontram representados professores, pais, pessoal não docente, autarquia e eventualmente representantes de entidades locais de carácter cultural, etc. Nas escolas onde funciona o ensino secundário os alunos deste nível elegem também representantes.
Foram muitas as expectativas criadas em torno do novo órgão. Em primeiro lugar, os conselhos directivos (rebaptizados como conselhos executivos), formados apenas por professores, passariam a ter um órgão fiscalizador da sua actuação. Por outro lado, o facto de professores, alunos e funcionários serem eleitos pelo método de Hondt parecia assegurar pela primeira vez a representação das várias correntes de opinião. A presença de membros não docentes poderia significar um passo em frente na abertura da escola à comunidade escolar. Em suma, esperava-se que a criação deste órgão tivesse trazido uma maior democraticidade à gestão escolar.
Pois bem, a generalidade das assembleias já cumpriu dois mandatos e o panorama é desolador. A divisão de poderes que o novo sistema configura apenas existe no papel. Os gestores das escolas têm conseguido assegurar a docilidade das assembleias, a ponto de, em muitas escolas, não se dar pelas reuniões desse "parlamento escolar", nem se conhecerem os nomes dos seus membros.
Basta ler a imprensa para constatar que, salvo raras excepções, a assembleia é um órgão-fantasma, corta-fitas, que reúne discretamente três vezes por ano, só para cumprir calendário e "pôr o carimbo" nas decisões do conselho executivo. Uma vergonha...
O que falhou no novo modelo de gestão? Algumas falhas tinham sido por nós apontadas - "Há quem lhe chame autonomia...", A Página da Educação, Junho 1998 - por ocasião da discussão pública da lei. Uma é a participação do presidente do conselho executivo nas reuniões da assembleia, que lhe permite influenciar e controlar o órgão que alegadamente fiscalizaria a sua acção. Outra, a ausência de democraticidade na escolha de alguns membros da assembleia, pois os representantes dos pais e do município não são directamente eleitos, mas designados. Outra ainda, os meios oferecidos aos executivos para, "cozinhando" a lei eleitoral a seu bel-prazer, garantir a eleição dos seus "favoritos" e dificultar a eleição de docentes que não aprovem acriticamente as decisões do chefe.
(...) Tudo seria diferente se os professores quisessem colocar nas assembleias pessoas que soubessem debater os problemas da escola e que não tivessem medo de votar contra. Mas o alheamento, o comodismo, a subserviência perante o poder são já há muitos anos a imagem de marca do corpo docente.
A "partidarite" que invadiu as escolas faz com que a composição das listas obedeça a arranjos de política partidária – até a extrema-direita já começa a espreitar -, sem que os professores se apercebam, o que transforma as assembleias em correias de transmissão de autarcas, partidos políticos ou lobbies.
Terminamos deixando um alerta aos professores de todos os graus de ensino. É bom que fiquem cientes da ameaça para a estabilidade (e dignidade) profissional que podem vir a ser os contratos de autonomia a celebrar entre escolas e autarquias. Significam entregar a selecção dos professores ao livre arbítrio do executivo de cada escola, eventualmente a mando de algum tiranete que presida à câmara municipal. Pois bem, cabe às assembleias aprovar os termos dos contratos de autonomia. Querem vê-los aprovados “de cruz” e às escondidas de toda a gente?
A decisão é só vossa!"


Ana Paula da Silva Correia e José Rodrigues Ribeiro

Esposende

O mote está lançado e constitui um desafio ao contraditório:
Haverá uma assembleia de escola neste país de faz de conta que não faça de conta?

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