10 de fevereiro de 2008

O maior cego é o surdo...

A crónica dominical de António Barreto (AB) revela uma distracção difícil de explicar num cronista tão experimentado. Se tivesse acompanhado com alguma atenção o debate sobre esta matéria [o debate sobre a gestão escolar], se tivesse lido os pareceres do Conselho de Escolas, de alguns investigadores, dos sindicatos, se tivesse acompanhado as discussões na blogosfera educativa e nos jornais de referência, AB seria capaz de formular um juízo mais fundamentado sobre o assunto. Pelo teor da sua crónica, presumo que terá tido em consideração apenas as posições do ME e, porventura, dos acólitos da CONFAP.

AB considera que é uma boa decisão alterar o regime de gestão das escolas porque vê com bons olhos a entrega de poderes a um director; a intenção de entregar às comunidades locais novas competências e responsabilidades [que confusão é esta? A transferência de competências para os municípios é outro assunto, caro AB]; alargar a autonomia da gestão das escolas; a criação de um conselho geral, com a participação de pais e autarcas.

A pergunta que AB devia ter procurado resposta é a seguinte: Mudar para quê? AB verificaria que as alterações que propõe são exequíveis no actual “regime de gestão das escolas”. AB diz que a gestão colegial tem dado maus resultados mas não diz em que se baseia para chegar a esta brilhante conclusão: a Inspecção Geral da Educação atesta precisamente o contrário. AB refere que o afastamento das comunidades e das autarquias, relativamente às suas escolas, tem tido há décadas, consequências nefastas. Diz ainda que existe já alguma evidência de que os pais se interessam mais pelo destino da escola e dos seus filhos. Mas se há uma evidência de que as coisas estão a melhorar com o actual regime, faz algum sentido mudar agora que melhoram os resultados? Finalmente, AB considera que “as escolas sem autonomia ou com autonomia aparente, com é hoje o caso, transformam-se em repartições dominadas pela burocracia do ministério obcecada com a regulamentação e a uniformização.” A pergunta que se impõe é a seguinte: Se o problema é do ministério, para quê mudar a gestão das escolas. Seria mais aconselhável mudar o funcionamento do ministério, ou não?

AB considera que não é possível governar o ME. Por ser ingovernável, o ME deveria entregar às autarquias as suas competências. Ora, AB presume que as autarquias são governáveis. Eu não estaria tão confiante. Basta olhar para os elevados endividamentos das autarquias para se perceber do que falo. Basta olhar para as experiências já relatadas, e censuradas, nos relatórios de avaliação das actividades de enriquecimento curricular para se perceber que o problema não está na dimensão das organizações mas na incompetência dos políticos que as gerem. Organizações grandes ou pequenas.

Se a ideia é aligeirar as responsabilidades da sua homóloga, a socióloga Maria de Lurdes Rodrigues, relevando a coragem e as ideias da ministra, AB perderá o seu tempo, apesar de eu lhe reconhecer o esforço corporativo. Em primeiro lugar, terá de ser mais claro e explicar a que ideias se refere: se se refere ao ataque descabido à classe docente, à incontinência legislativa tantas vezes contraditória, ou aos constantes atropelos à lei. Em segundo lugar, se AB pretende avaliar a acção dos ministros pelas suas intenções, nenhum ministro cairia do governo porque todos os ministros serão inatacáveis na medida em que se presume que todos eles se movem por motivos altruístas.

António Barreto engana-me cada vez menos...

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