5 de fevereiro de 2006

Será que vale a pena relembrar?

"O acolhimento afectivo (Hargreaves, et al., 2001. pp. 79-80)(1)

A maioria das reformas escolares parecem não atribuir importância ao afecto. E o trabalho emocional de dar suporte afectivo raramente é reconhecido como central na determinação do profissionalismo do professor. No entanto, conforme defendem autores como Noddings (1992), o afecto não é apenas um pré-requisito essencial para a aprendizagem, é ele próprio uma forma de aprendizagem:
Se a escola tem um objectivo principal, esse deve ser o de promover o crescimento dos estudantes como pessoas saudáveis, competentes, morais... O desenvolvimento intelectual é importante, mas não pode ser a primeira prioridade da escola (p. 10).
Os estudantes, segundo a autora, preocupam-se pouco com aquilo que têm que aprender (um problema do currículo). E queixam-se de que os professores não se preocupam com eles (um problema de apoio). A questão para a escola, sugere, não é o dançar ao ritmo do movimento da eficácia, perseguindo o princípio de que "todos os jovens podem aprender", mas perguntar-se antes o que é que os jovens devem aprender. Segundo Noddings, a afectividade, apreendida quer no currículo formal quer nas relações humanas, é um dos conteúdos mais importantes que os estudantes devem reter.
Existem várias formas mediantes as quais a escola e os educadores podem alargar os seus horizontes para além do plano puramente académico e perspectivar um espaço claro para o afecto na educação dos jovens. Para Noddings, alguns desses domínios-chave, ou centros de afecto, como lhes chama, são:
. Afecto por si/cuidado consigo – para o bem-estar físico (não apenas a "malhação" auto-indulgente, mas também o exercício físico ao serviço dos outros), vida espiritual, trabalho e recreação;
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Afecto pelo próximo – pelos colegas e namorados, como preparação para a intimidade / vida em comum, pelos amigos e vizinhos, e, não menos importante, pelas crianças, através de oportunidades de trabalho com elas, no quadro escolar;
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Afecto por colegas e conhecidos – por colegas e comunidades, em relações recíprocas de ajuda e apoio: uma preparação essencial para um bom (e produtivo) ambiente de trabalho e para uma cultura de serviço à comunidade;
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Afecto pelos animais - pelos animais de estimação em particular, mas também por todo o mundo animal;
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Afecto pelas plantas e pelo ambiente – para cuidar do próprio jardim, para apreciar a natureza e para cuidar do ambiente;
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Respeito pela obra humana – pela manutenção dos objectos (contra a cultura do desperdício) e do património estético e arquitectónico no meio rural e urbano;
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Respeito pelas ideias – pelas paixões do intelecto e da criatividade: não no sentido do processamento indiferenciado de todos os factos, mas no sentido da perspectiva e imaginação que o conhecimento e a reflexão permitem.
Isto não significa que o academismo não seja nada e o afecto tudo. Com efeito, as escolas do interior e as escolas com uma população mais humilde, que procuram providenciar um ambiente afectivo aos seus alunos, mas que não os estimulam intelectualmente, não lhes prestam um grande serviço, a longo prazo (Hargreaves, 1995). Mas, na maioria dos casos, a relação entre o lado afectivo e o académico pesa infelizmente no sentido contrário. Muitos jovens não irão aprender os conteúdos académicos se não se ligarem afectivamente aos assuntos. Se se sentirem isolados, perdidos e à deriva na escola, eles vão desligar-se da aprendizagem. E sem aprenderem as competências, responsabilidades e recompensas do afecto e da cooperação com os outros, todo o desenvolvimento intelectual do mundo não fará deles melhores pessoas ou melhores cidadãos (como o demonstram muitos déspotas de finíssima inteligência).
O afecto é importante. Não nos podemos dar ao luxo de o esquecer."


(1) Hargreaves, A.; Earl, L.; Ryan, J (2001). Educação para a mudança - Reinventar a escola para os jovens adolescentes. Porto Editora.

Adenda: Vá ao outro lado do oceano para conhecer a OFICINA DE PROJETO.

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