3 de setembro de 2006

Orgulhosamente filhos de Rousseau* (II)

[cont.]
A autoridade pedagógica. E. Durkheim, escrevendo no dobrar do século, concebia o professor como representante dos valores fundamentais da sociedade e como tal implicado na transmissão da cultura. O professor desfrutaria de uma autoridade moral e intelectual que lhe permitiria estimular: os seus alunos basicamente através do seu sentido de dever.
O professor, afirmava Durkheim, seria o agente social mais respeitado da sociedade. A sua autoridade dimanava da sua superioridade tanto em termos da sua experiência do mundo como da sua cultura.
W. Waller, alguns anos depois de Durkheim, - o seu famoso livro The Sociology of Teaching data de 1932 - falou dos professores como agentes remunerados da difusão cultural que «transportavam a luz aos mais recônditos cantos da Terra». Mas ele também reconheceu que na moderna sociedade industrializada a autoridade do professor repousa em última instância sobre um tipo de liderança «institucionalizado» que significa fundamentalmente que esta liderança é sancionada pela lei. Por outras palavras, o Estado confere o direito de mandar na sala-de-aula, de instruir, de avaliar. Contudo, mesmo esta autoridade institucionalizada foi considerada insuficiente por Waller - o professor necessitaria também de um conjunto de recursos pedagógicos de forma a ser eficiente e a consolidar a sua influência pessoal na escola e, sobretudo, na sala-de-aula.
Os sociólogos funcionalistas dos anos 50 e 60, ir representados por T. Parsons, concordam com Waller relativamente ao facto de que pelo desenvolvimento da sociedade industrial avançada o valor da autoridade moral do professor se debilitou e se tomou menos claro. Sustentam também que a superioridade cultural e de experiência do professor, num mundo de saber cada vez mais profano, é, cada vez mais questionável. Por isso o professor deve recorrer a estratégias pedagógicas para garantir a sua autoridade, (agora cada vez mais personalizada) sobre os seus alunos.
Por outro lado, defendem que a sociedade industrial avançada oferece ao professor uma nova base de autoridade: a escola toma-se uma importante agência para a distribuição de oportunidades de emprego numa situação em que o elo entre a ocupação e a educação parece ser cada vez mais forte. Todavia, esta nova autoridade não substitui facilmente a autoridade moral perdida pelo professor, dado que cria cepticismo tanto nos pais como nos alunos. Há, pois, nesta nova componente do papel do professor, uma preocupação prosaica com o conhecimento prático, com o know-how, isto é, parece ser mais importante a preparação técnica do que a educação propriamente dita.
T. Parsons sublinhou que o sucesso do professor na sala-de-aula dependia da sua capacidade de manipular e persuadir os seus alunos da sua capacidade como professor, dado que o papel do professor na sociedade moderna é menos definido (quer dizer, os valores sobre os quais se baseia são mais laicos, mais neutrais e menos precisos). Ao mesmo tempo, Parsons defendeu que o professor na sociedade industrial avançada só poderia manter a sua superioridade moral através de uma adequada compreensão das dimensões sociais da sua profissão, isto é, das determinantes sociais do processo educativo, das tensões sociais latentes nas escolas inerentes a qualquer situação de aprendizagem.
Nos anos mais recentes quem mais se tem debruçado sobre a especificidade da pedagogia e da evolução do papel do professor tem sido o sociólogo inglês B. Bernstein. Através da sua obra aprendemos que a autoridade do professor é sempre uma autoridade condicionada pelas clivagens existentes na sociedade. Na sociedade industrial a clivagem de classe social que mais determina o trabalho pedagógico do professor. Assim, Bernstein alerta: "embora pareça mentira, os professores deveriam preocupar-se mais quando as crianças realmente aprendem do que quando não aprendem. Porque as crianças que aprendem levam na sua consciência a dos que não aprendem e os procedimentos para reproduzir a situação» (Entrevista com B. Bernstein», Professor, 25, Fevereiro de 1980, pág. 23).”
*[Magalhães, Stoer, 1998, pp. 39-41] [cont.]

Sem comentários: